Pode parecer contraditório, quase irónico, mas o corte nos incentivos à energia eólica poderá tornar esta forma primária de energia eléctrica economicamente sustentável no futuro. E quando digo economicamente sustentável refiro-me evidentemente como forma minoritária de complemento do mix produtivo, não como forma de produção de electricidade de base como advogam políticos desconhecedores e irresponsáveis.
A manutenção de subsídios à produção eólica, muitas vezes desproporcionadamente elevados como acontece em Portugal, mantém o sector a viver numa prosperidade artificial. Esta realidade fabricada castra o seu desenvolvimento equilibrado. Os produtores de turbinas não se sentem impelidos a procurar maior eficiência e competitividade dado que a manutenção de mercado consumidor de equipamentos, por via das tarifas feed-in, tem garantido o escoamento de toda a produção.
A recente crise mundial veio abrandar o entusiasmo eólico. Por um lado os países começaram a atribuir menos licenças, por outro os potenciais candidatos à exploração de parques sentem maior insegurança para investir dada a imprevisibilidade da manutenção dos incentivos essenciais à viabilidade dos projectos. O resultado foi, como reconhece a EDP Renováveis, um decréscimo de 25% no preço das turbinas eólicas no último ano. E como afirma Rui Teixeira, tal deveu-se essencialmente à quebra no ritmo de venda de turbinas.
A produção de energia eólica praticamente não tem custos marginais em virtude do seu combustível ser gratuito. Pode-se afirmar, com uma imprecisão aceitável, que o decréscimo do preço do equipamento resulta numa diminuição equivalente do custo da electricidade produzida. Até há pouco tempo os parques eólicos conseguiam gerar electricidade com um custo (fortemente influenciado pelo factor de capacidade) entre €65 e €70 por MWh. Evidência disso é o facto da tarifa feed-in nacional estipulada (mas não cumprida) para parques eólicos estar fixada em €75/MWh durante 15 anos (um parque eólico dura entre 15 e 20 anos). Com uma redução de 1/4 no preço das turbinas estas conseguem produzir electricidade entre os €48 e os €53/MWh.
Se tomarmos o exemplo ibérico isso torna esta forma de electricidade quase competitiva se tivermos em conta o preço médio (€46 em 2010). Na prática, as turbinas eólicas "concorrem" por um preço inferior ao preço médio de mercado por duas razões. Estatisticamente, geram mais electricidade em horas de vazio. E, quando em excesso e devido à sua incontrolabilidade, fazem baixar o preço da electricidade quando mais fornecem por excesso de oferta. Seja como for é inegável que a energia eólica está mais competitiva do que há 12 meses atrás.
Um bom exemplo foi divulgado pelo blog a ciência não é neutra. Foram recentemente leiloadas licenças de exploração de energia eólica no Brasil por uns surpreendentes €41/MWh. Como a energia eólica está a dar os primeiros passos no Brasil estão a leiloar-se as melhores localizações, nomeadamente no estado do Ceará, onde o factor de capacidade chega a atingir uns excelentes 34%. Voltando a assumir ausência de custos marginais e proporção directa nos custos produtivos podemos comparar a eólica brasileira e ibérica. Se os novos parques do nordeste brasileiro tivessem um factor de capacidade igual aos "nossos" (28% em 2010 usando dados oficiais) o custo unitário da electricidade subiria para €50/MWh que fica dentro de intervalo que determinei atrás.
A recente e franca descida do preço de venda das turbinas coloca a questão da saúde financeira dos fabricantes em países de mão-de-obra cara. Apesar dos impedimentos físicos, é provável que se assista ao reforço da migração da produção de turbinas para países com custos de produção mais reduzidos tal como está a acontecer na indústria de painéis solares fotovoltaicos. Esse é um problema que não afecta Portugal dado que não existe indústria nacional relevante de turbinas eólicas. Estrategicamente o país só tem a ganhar em cortar progressivamente os subsídios à produção eólica (e também solar). Diminui os custos directos na aquisição da energia eólica e força as empresas que se queiram implantar a procurar maior eficiência e fornecedores de equipamento mais barato.
Obviamente que esta não é a visão das empresas que exploram a energia renovável em Portugal habituadas que estão ao regime singular de que têm desfrutado. Como salienta o Ecotretas, a indefinição relativamente ao futuro das tarifas feed-in está a deixar o sector bastante nervoso e tem travado o surgimento de mais potência renovável em Portugal.
Claro que a (maior) competitividade do preço da energia eólica só se atinge nos moldes descritos anteriormente se o seu peso no mix de produção permitir o consumo imediato de toda a electricidade produzida. Esse equilíbrio já foi amplamente ultrapassado em Portugal e na Península Ibérica. Isso obriga a haver centrais a gás natural a trabalhar parcialmente e de forma ineficiente para compensar a ausência de vento e barragens com bombagem para armazenar excessos. Estes equipamentos suplementares fazem disparar o preço da energia eólica e tornam a sua competitividade, mesmo no longo prazo, uma miragem só visível para pessoas desinformadas ou desonestas.
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