segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Reino Unido e Portugal diminuem subsídios à microgeração solar

Depois de, em Agosto, ter reduzido as tarifas feed-in ao solar em larga escala o Department of Energy and Climate Change (DECC) britânico propôs hoje a diminuição em 55% dos subsídios à geração solar doméstica, mas apenas para instalações posteriores a 2011. Os projectos até 4 kW passarão a receber 21p/kWh  em vez dos actuais 43,3p/kWh. De acordo com o DECC os novos valores reflectem um abaixamento de 30% no preço dos equipamentos. Se nada fosse feito:
by 2014-15 FITs for solar PV would be costing consumers £980 million a year, adding around £26 (2010 prices) to annual domestic electricity bills in 2020. Our proposals will restrict FITs PV costs to between £250-280 million in 2014-15, reducing the impacts of FITs expenditure on PV on domestic electricity bills by around £23 (2010 prices) in 2020.
2012 tambem traz novidades à microgeração solar portuguesa. Saiu na sexta-feira passada a Portaria n.º 284/2011 que estabelece uma remuneração de €326/MWh nos primeiros 8 anos e de €185/MWh nos últimos 7 anos. A quota de potência a instalar anualmente também cai de 25 MW para 10 MW. 

A presidente da Associação Portuguesa da Indústria Solar (Apisolar), Maria João Rodrigues, disse ao jornal de negócios que o novo enquadramento cria um "ambiente de choque" entre os empresários do sector.

Da minha parte saúdo a portaria, só acho que o "haircut" na quota devia ter sido 10 MW maior. Pelas razões que defendo aqui a microgeração devia acabar quanto antes. Para o problema energético do país esta portaria não terá impacto visível.



quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Sugestão de poupança singela no Estado

É certo que ainda há pouco tempo o anterior Primeiro-Ministro José Sócrates fazia questão de se mostrar aos jornalistas num Nissan Leaf na tentativa de convencer mais portugueses a comprarem dispendiosos armazéns ambulantes de energia eólica nocturna. Até agora só centena e meia de portugueses se deixaram convencer.

Infelizmente esses tempos de abundância e desafogo económico terminaram. Porém, o legado não e existe uma limpeza de "gorduras" que deve ser feita. Como sugestão de exemplo de boas práticas aconselho a revogação da resolução do Conselho de Ministros n.º 81/2009 que diz respeito a mobilidade eléctrica ou, citando o documento (realce meu):

(...) o Governo pretende posicionar o País como pioneiro na adopção de novos modelos para a mobilidade, que sejam sustentáveis do ponto de vista ambiental, que possam explorar a relação com a rede eléctrica e maximizem as vantagens da energia produzida a partir de fontes renováveis e, bem assim, se integrem mais harmoniosamente com o ritmo de funcionamento e desenvolvimento das cidades.
Ou como, disse acima, cativar os privados a adquirir equipamentos de armazenamento de energia eólica excendentária.

5- c) Aquisição anual de 20 % de viaturas automóveis eléctricas em processos de renovação da frota da administração central;
Tendo em conta o seu custo e o facto de não serem, neste momento, economicamente competitivas parece-me despropositado que o Estado peça sacrifícios aos portugueses e depois gaste dinheiro em luxos.

5-e) Promoção da prioridade à circulação de veículos eléctricos em vias de alta ocupação e criação de zonas preferenciais de estacionamento nos centros urbanos;
Uma discriminação que considero injustificável e contra a qual já escrevi aqui.
5-g) Implementação em Portugal de uma plataforma de investigação, desenvolvimento e teste de sistemas de gestão da mobilidade eléctrica.
Só para este ponto o fundo de apoio à inovação (FAI) do ministério da Economia que já referi aqui já atribuiu €3,2M para o arranque do Mobi.E, €1M para o Programa da Mobilidade Eléctrica e €3,3M para o projecto REIVE (Redes Eléctricas Inteligentes com Veículos Eléctricos). Não sou contra o financiamento de investigação mas sou contra a ideia de que é forçando adiminstrativamente a introdução de carros eléctricos que se vai obter a desejada eficiência energética no país.

A eficiência não pode ser o objectivo último da política energética de Portugal nem pode ser atingido aumentando a despesa pública. Deve correr paralelamente com a criação de um parque electropodutor bem dimensionado e sustentável.

Alemanha não quer apagar-se sozinha

Mathias Platzeck
Os governantes alemães não querem apenas fazer o país recuar 50 anos na forma de produzir energia eléctrica e hipotecar qualquer hipótese de cumprir objectivos ambientais que os próprios estimularam. A Alemanha quer arrastar consigo o máximo de países europeus que conseguir. É conhecida a oposição antiga de alemães e austríacos em relação à central nuclear checa de Temelín. Daqui a uns dias vou postar sobre a mirabolante ideia germânica de produzir energia solar na Grécia. Mas neste post dou a conhecer a oposição exercida pelo presidente do estado federal de Brandenburg, Matthias Platzeck, à construção de uma central nuclear na Polónia. Brandenburg fica no extremo leste da Alemanha (parte da antiga Alemanha Oriental) e faz fronteira com a Polónia.

As quatro localizações preferidas pelos polacos distam 275, 340, 345 e 600 km de Berlim. Nenhuma é suficientemente longe de Berlim para Platzeck. Só Varsóvia dista 560 km da capital alemã como se pode ver pelo mapa abaixo. Não existem muitos locais na Polónia que estejam a mais de 600 km de Berlim. É provável que não exista nenhum local na Polónia a mais de 600 km de Berlim que seja adequado à instalação de uma central nuclear. Que quer Platzeck? Impedir a construção de uma central nuclear na Polónia?

Distância de Varsóvia a capitais de países vizinhos
A Polónia é o maior produtor de carvão da União Europeia (UE) e é essa a fonte de 90% da energia eléctrica que consome (mais 5% gás natural e 5% renováveis). Graças a estes recursos a Polónia tem uma elevada segurança na produção de energia eléctrica e tem dos mais baixos preços da UE. Porém é um desastre ambiental que aparentemente não preocupa os alemães que até a têm importado depois de terem desligado parte das suas centrais nucleares. A Polónia não só tem as maiores reservas de carvão da UE como uma das maiores de gás xistoso. Será interessante a Polónia substituir parte das centrais a carvão por unidades a gás natural. Mas a base do diagrama deve ser preenchido por centrais nucleares. As centrais de ciclo combinado de produção mais flexível podem complementar a produção nuclear que é mais rígida. A contestação alemã à modernização do parque electroprodutor polaco é inaceitável.

Para os contribuintes alemães devia ser inaceitável correr riscos de vir a pagar indemnizações às utilities alemãs por estas terem sido obrigadas a desligar centrais nucleares perfeitamente operacionais, uma decisão que até se pode vir a revelar inconstitucional. Para os europeus devia ser inaceitável que a Alemanha deixe de consumir energia nuclear limpa para importar energia poluente polaca. Os gases poluentes, depois de emitidos, não conhecem fronteiras.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

E.On e RWE à beira de recuperar €170M

Grafenrheinfeld (E.On) já pagou €96M de taxa de combustível
Uma pequena retrospectiva. Em 2010 a Chanceler Merkel aprovou o prolongamento da vida das centrais nucleares alemãsintroduziu simultaneamente uma taxa de combustível para as centrais nucleares. Em 2011 não só voltou atrás em relação à primeira decisão como mandou desligar oito reactores. A segunda decisão foi mantida. As utilities alemãs moveram processos ao estado alemão para recuperar as taxas já pagas e para serem indemnizadas pelo prejuízo da paragem dos reactores. A E.On e a RWE, duas das maiores empresas alemãs a operar no sector energético, têm tido pareceres favoráveis junto das instâncias judiciais alemãs e aprestam-se para serem ressarcidas em €170M.

Correm outros processos em tribunal interpostos pelas utilities depois da moratória de Março. A paragem dos reactores nucleares pode vir a ter mais custos para os contribuintes que não seja os que decorrem de mais importação de energia eléctrica.

Certo é que terá um impacto nas contas das empresas operadoras das centrais, com todas elas a reverem em forte baixa os seus resultados em 2011 e a E.On a estimar despedir 10.000 pessoas no médio prazo.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

BIll Gates financia desenvolvimento em nuclear

Muito se tem dito e escrito sobre a importância de Steve Jobs para a economia americana e para a evolução da humanidade nas últimas décadas. Existe outro americano cuja relevância é tão grande quanto a de Jobs, na minha opinião maior. Estou a falar de Bill Gates, fundador da Microsoft e filantropo. Desde que deixou a gestão executiva da Microsft Bill gates tem-se dedicado às grandes questões mundiais, nomeadamente o futuro da geração eléctrica. Não excluindo nenhuma Bill Gates considera o nuclear a solução mais promissora e pronuncia-se sobre o tema. Na verdade faz mais do que falar dele. Gates apoia pessoalmente uma ideia muito promissora, o reactor Terrapower.

Neste primeiro vídeo, Bill Gates começa por falar sobre as alterações climáticas e sobre as necessidades mundiais de energia. Acredite-se ou não na influência das actividades humanas para as alterações climáticas, a energia nuclear é a melhor solução para reduzir a poluição gerada pelo Homem e ao mesmo tempo conseguir que a energia eléctrica chegue para todos. A meio do filme Gates apresenta o reactor Terrapower.


Neste segundo filme Bill Gates fala sobre a necessidade de introduzir novos designs de reactores mais seguros e eficientes. E diz como com a criação de modelos em computador é possível simular o comportamento dos reactores a desastres naturais.


Para finalizar, no filme que se encontra neste link, Bill Gates responde a questões sobre financiamento de construção de centrais nucleares. Reconhece que a enorme regulamentação que existe no sector nuclear (em contraste total como o que Gates sempre esteve habituado no sector das tecnologias de informação) torna o seu desenvolvimento lento e afasta o investimento. Todavia, Gates diz ser imprescindível potenciar o desenvolvimento, acha que centenas de startups deviam aparecer neste sector para que daí saiam novas ideias e soluções para o enorme desafio que é abastecer o mundo com energia segura, limpa e barata. No fundo, Gates defende que se deve criar no nuclear o ambiente que permitiu a empresas como a Microsoft, Apple ou Google nascerem para revolucionar o planeta.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Alemanha laboratório de offshore

Alpha Ventus localizada em águas internacionais
O Der Spiegel, jornal que gosto de referir pelo seu cepticismo em relação à política energética alemã, lançou um extenso e interessante artigo sobre Alpha Ventus, o maior parque eólico offshore alemão. Alpha Ventus está situado no mar do Norte, em águas internacionais e a 45 km da costa alemã. São 12 turbinas e 5 MW o que perfaz 60 MW. É o primeiro parque de um ambicioso plano:  
The German government plans to install another 10,000 megawatts offshore by 2020, and 25,000 megawatts by 2030.
That would mean another 5,000 of these wind turbines, or 400 wind farms the size of Alpha Ventus. Large swaths of the German Bight would then resemble a pincushion from afar, turning the body of water into a sea of megawatts.
Estes objectivos inserem-se no plano alemão de aumentar o contributo renovável para o seu mix energético:
Germany is the first highly developed, industrialized nation to decide to be dependent on renewable energy in the future. 

The goal, according to the proponents of wind energy, is to end Germany's epochal dependence on petroleum, so that it will no longer be reliant on a country ruled by someone like Russian Prime Minister Vladimir Putin. The goal is to do nothing less than change the climate system and set the agenda for the 21st century. A bigger task is hardly imaginable. Germany has made a bet that it cannot afford to lose.

And everyone is watching. If the phase-out works in Germany, and if the Germans can at least partially replace nuclear power with wind energy, it can work in Great Britain, Chile, France and California. Germany has become a test laboratory.
A Alemanha não é o único laboratório de elevada integração de energia eólica no parque electroprodutor. Portugal também pertence a este restrito clube. Como já tenho defendido neste blog, o nosso país devia ter outras metas mais pragmáticas e menos dispendiosas do que esta.

O artigo depois torna-se mais cru e realista (aconselho a sua leitura integral): 
The pilot wind farm was to cost about €175 million, a number that eventually went up to €250 million. The farther offshore a wind farm is located, the stronger the wind. But the greater distance from the coast also makes the project most costly and logistically complex.
Isso significa €4,17M/MW. A este preço por MW Flamaville 3 custaria €6.800M, mais caro do que as últimas estimativas de €6.000M. Flamaville 3 funcionará com um factor de capacidade em redor dos 90%. Alpha Ventus está colocado em mar alto e por isso tem tido um impressionante, para eólica, factor de capacidade de 49%:
Alpha Ventus delivered 190 gigawatt hours of electricity in its first nine months of operation.
Por se situar em mar alto Alpha Ventus tem requisitos específicos, nomeadamente de manutenção. Como diz o responsável pelo seu funcionamento Ralf Klooster (plant significa turbina neste contexto):
"Each individual plant," says Klooster, "currently requires about 450 maintenance hours a year. We have to get this down to 150." That would be the minimum to make the turbines at least somewhat profitable. But everything is so incredibly difficult.
Mas o parque é rentável. E é rentável porque ao abrigo dos incentivos dados pela legislação alemã a energia fornecida por Alpha Ventus é remunerada a €130/MWh:
That's because Germany's Renewable Energy Act (EEG) guarantees offshore wind farm operators a so-called feed-in compensation of 13 cents per kilowatt hour.
Este valor é 275% (130/46) o preço médio da energia eléctrica no MIBEL e 140% (130/94) a remuneração média da eólica terrestre portuguesa. Mas como sabemos a EDP já gastou €20M numa experiência piloto de eólica offshore em mar profundo. Não é só a Alemanha que quer ser laboratório de renováveis.

domingo, 23 de outubro de 2011

Kyoto vai morrer em Durban?

Vai realizar-se entre 28 de Novembro e 9 de Dezembro em Durban, África do Sul, a Conferência das nações Unidas para as Alterações Climáticas com a presença de representantes de 200 países. Um dos assuntos em agenda é a revisão do Protocolo de Kyoto que termina no final de 2012.

Mas como nota o Der Spiegel o mais provável é não haver seguimento e o Protocolo de Kyoto morrer dentro de um ano. Em boa verdade apenas a Europa levou a missão preconizada pelo Protocolo verdadeiramente a sério. Outros países desenvolvidos caso dos EUA, Canadá ou Austrália viram as suas emissões de CO2 aumentar desde 1997, o ponto de partida do actual Protocolo de Kyoto. Como se pode ver no gráfico, graças ao contributo da China e de outros países em desenvolvimento o valor de emissão de 1997 foi largamente ultrapassado em 2010. Mesmo que a EU mantenha os seus compromissos no que toca a emissões de CO2 eles valem apenas 15% das emissões globais pelo que o impacte não é significativo.

O fim do Protocolo de Kyoto poderá a prazo ditar o fim do comércio de créditos de carbono na Europa conhecido como European Trading Scheme (ETS). Se isso acontecer a sustentabilidade do modelo eléctrico nacional estará em maior risco. Se o ETS acabar devem ser introduzidas em Portugal (e desejavelmente na EU) taxas sobre emissão de "verdadeiros" poluentes caso de NOx, SO2 ou partículas. Taxas que reflictam verdadeiramente os danos ambientais provocados por cada forma de produção de energia eléctrica. Desconfio que a Alemanha, altamente dependente de carvão, não seria grande adepta da medida.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Espanha desincentiva energia eólica

Sentença de morte em Espanha?
Uma das reservas que me levanta o novo plano energético para Portugal tem que ver com a forte possibilidade de Espanha rever a sua política e reapostar no nuclear. Creio que a questão não é "se" mas "quando" isso irá acontecer.  Espanha tem um problema gravíssimo com um défice tarifário cerca de dez vezes superior ao português para um consumo eléctrico cerca de cinco vezes maior. E numa altura em que as agências de rating "atacam" a qualidade da dívida espanhola e no clima de todas as convulsões financeiras na Europa urge conter este défice.

Mesmo que não seja com nuclear, Espanha terá de diminuir produção especial em favor de produção ordinária para baixar custos de geração. Com uma produção cinco vezes maior do que a nossa o digrama de cargas ibérico vai alterar-se, o custo no MIBEL também. Não digo que seja inevitável acontecer o mesmo por cá mas no MIBEL nórdico, o Nordpool, em que existe um país de produção inferior e muita eólica (Dinamarca) e dois países com mais produção e quase toda ordinária (Noruega e Suécia) a base de licitação do mercado é de €-20/MWh.

Racional seria Portugal parar imediatamente adição de mais potência renovável e renegociar a remuneração da existente. Como é uma medida radical sugeri, pelo menos, baixar as tarifas de novos contratos para valores que reflictam os actuais custos de produção (€55/MWh eólica e €170/MWh fotovoltaica). Também devia haver ajustes na restante produção especial. E considero que os incentivos à microgeração e mini-hídrica deviam acabar desde já por uma questão de justiça social.

Mas hoje o Ecotretas revelou que Espanha vai cortar unilateralmente os subsídios à produção eólica, cerca de 40% do valor actual. A atribuição passa a ser de apenas €55/MWh (o valor que calculei como justo), durante 12 anos ao invés de 20 e para 1.500h/ano no lugar de 2.100! Naturalmente a Asociación Empresarial Eólica (AEE) prevê que, da potência prevista instalar até 2015, só 12% venha a ver a luz do dia. Ou seja, Espanha foi mais longe do que aquilo que o governo português diz ser possível em Portugal ou até daquilo que sugeri. Não tenhamos ilusões, em Espanha a sentença de morte da energia eólica foi decretada.

Não deixo de ficar impressionado com o ritmo dos acontecimentos no sector eléctrico ibérico. Escrevi, quando construi os cenários de 2 e 3 reactores de 1.600 MW em Portugal, que essas possibilidades devem ser coordenadas com Espanha para haver escala para gerar economias e capacidade de gestão. Não me preocupa essa necessidade pois sempre achei que Espanha ia liderar o processo. Creio que essa mudança se inicia precisamente com este corte nos incentivos à eólica espanhola.

Relembro que quando a Holanda fez um corte de 40% nos incentivos à eólica anunciou simultaneamente um programa nuclear.

Fim do nuclear obriga a compromissos ambientais

Parque nacional de Nikko - Japão
É sabido, o Japão, que planeava aumentar a fatia nuclear de geração eléctrica dos 30% em 2010 para os 50% em 2030, está a rever essa política depois de 11 de Março. A vontade é apostar em fontes renováveis mas o Japão enfrenta grandes desafios para perseguir esse objectivo.

Sendo geograficamente um arquipélago o Japão não tem a possibilidade de equilibrar a flutuação de produção eólica com importação/exportação como fazem os países europeus que "brincam" às renováveis. E o Japão também não tem recursos hídricos para, através da bombagem, gerar energia de base renovável numa associação eólica/hídrica.

Mapa de parque nacionais do Japão
Resta-lhe aproveitar fontes renováveis passíveis de cumprir os requisitos de despachabilidade e armazenagem que enunciei aqui. Isso significa recorrer à geotermia e hidráulica. Porém, para estas ambicionarem substituir as centrais nucleares têm de ter a escala necessária. O Japão não é nem o Brasil (forte em hidroeléctrica) nem a Islândia (forte em geotérmica) pelo que o parlamento japonês se prepara para, em 2012, desregulamentar na protecção ambiental do país. Vai ser permitido fazer furações para geotermia em parque nacionais e aproveitar terrenos agrícolas para o mesmo fim. Vão ser agilizadas leis da água e dos rios para permitir a construção de novas barragens. E naturalmente, como estas fontes renováveis não estão todas próximas dos centros de consumo mais investimentos terão de ser feitos no acesso à rede

Mapa das maiores cidades do Japão
Os japoneses reclamam o fim da energia nuclear evocando razões ambientais mas estão dispostos a "aligeirar" leis de protecção ambiental para o fazerem. Contudo a produção renovável cobrirá apenas parte das necessidades pois o Japão não tem recursos para substituir toda a produção nuclear por renovável. O restante terá de ser obtido em centrais de gás natural ou carvão o que implicará reforços na capacidade dos portos e armazenamento de matérias-primas. Repare-se que esta central a gás natural vai ser construída na baía de Tóquio, junto do consumo e do abastecimento externo de combustível.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Depois do Vietname a Turquia

A energia nuclear pode não ser boa para os japoneses mas é boa para o resto do mundo. Esse é pelo menos o entendimento do governo nipónico que estabeleceu recentemente conversações com responsáveis turcos no sentido de participar no programa nuclear do país euro-asiático. Estas conversações acontecem alguns dias depois de se saber que a Japan Atomic Power Company (JAPC) vai construir dois reactores nucleares no Vietname.

Como defendi neste post anterior o aparecimento de energia nuclear na Turquia é uma má notícia para Portugal. A Turquia é, e será cada vez mais, um concorrente natural de Portugal. Ao apostar em energia nuclear barata, quando por cá ainda se discute as virtudes económicas das fontes renováveis, vai desequilibrar a competitividade relativa entre os dois países.

Plano energético nacional 2020

Henrique Gomes - secretário de estado da Energia
Assisti, ontem, a uma conferência subordinada ao tema "Energia e Competitividade" onde um dos oradores foi o secretário de estado da Energia. Henrique Gomes falou sobre a dificuldade em alterar os contratos de todos os intervenientes do sector o que levou o executivo a ver-se obrigado a protelar a amortização do défice energético de €3.200M. Fiquei agradado com a abordagem bastante mais racional deste governo neste sector e não invejo a dificuldade que o ministério da Economia terá para terminar com "direitos adquiridos". Mas isso terá de acontecer sob pena de a rotura do sector acontecer mais tarde ou mais cedo. O secretário de estado disse que a energia vai passar a estar ao serviço da economia e não o contrário como aconteceu até aqui. Mas a forma como essa mudança se vai processar não me deixa totalmente tranquilo. Para tal o ministério da Economia estabeleceu um plano energético para 2020 com as seguintes linhas mestre:

- Limite a 1,5% do aumento anualizado do preço da electricidade

É um objectivo muito difícil de atingir, principalmente depois da liberalização do preço em 2013, e vai necessitar de enorme rigor e provável revisão de contratos CMECs e PRE. Para os cálculos entram receitas de venda de créditos de carbono e/ou hidraulicidade média para produção hidroeléctrica o que mostra bem até que ponto a meta está condicionado. Posso estar enganado mas creio ser provável que o comércio de créditos de carbono venha a desaparecer até 2020.  

- 55% de contributo renovável para o mix produtivo

Creio que esta meta pode ser incompatível com a de cima. 55% de contributo renovável significa, grosso modo, 20% de eólica, 30% de hidro e 5% de outras renováveis. Henrique Gomes falou de adicionar mais 1.200 MW (aos 4.000 MW existentes) de potência eólica. Se esta adição for toda licenciada a €75/MWh, ou seja, ao triplo do custo médio (€30/MWh) nas horas em que é fornecida significa um sobrecusto anual de (1.200x0,25x8.760x45) = €118,3M. Se diluirmos este valor pelo consumo 2010 (52.200 GWh) pode penalizar o preço da electricidade em €2,27/MWh, ou seja 2,27/47=4,82% de aumento. Só este valor por ano equivale a um aumento anualizado de 1,5% durante mais de 3 anos. É preciso juntar a consequente subida relativa de CMECs consequente. Torna-se difícil acreditar no cumprimento do objectivo de limitar o aumento do preço da electricidade.

Existe a vontade de impor às renováveis competição em mercado livre mas se isso acontecer o sector morre. Um parque solar custa hoje menos 50% e um eólico menos 25% do que há 12 meses. Mesmo que o governo ajuste o valor dos leilões para €170/MWh e €55/MWh, respectivamente, são valores que dificilmente vão atrair investidores e continuam a não ser competitivos em mercado livre. Mais tarde ou mais cedo o governo vai ter de deixar cair um dos objectivos por impossibilidade de conciliar os dois.

- Melhoria de eficiência energética em 25%

Tive a oportunidade de partilhar durante a conferência que esta meta é manter a economia ao serviço da energia. É um objectivo faraónico, para usar uma recente expressão de Álvaro Santos Pereira, e só concretizável com restrições ao crescimento da indústria e da economia real. Basta pensar que a bombagem, bastante ineficiente, vai ganhar peso no mix produtivo nacional nos próximo anos.

Mas é um objectivo previsível. Como é impossível acompanhar um consumo crescente de energia eléctrica com produção renovável sem fazer disparar o preço da electricidade a única forma de manter o equilíbrio do lado da produção é restringir o consumo a jusante.

Este governo já admitiu a insustentabilidade do modelo energético nacional, agora só tem que reconhecer que ele se reverte alterando o paradigma produtivo e não o paradigma consumidor. Defendo melhorias de eficiência energética em Portugal e são possíveis dada a elevada intensidade energética da nossa economia. Mas assentar a política energética nessa meta é prenúncio de desastre e isso é preocupante.

Como defensor da produção nuclear esta meta preocupa-me duplamente pois 9 anos de plano energético é um prazo demasiado curto para se planear introdução de energia nuclear no país. Se a meio desta década o país sentir uma necessidade urgente de adição de capacidade de geração eléctrica irá construir mais centrais de ciclo combinado, o que pode atirar para depois de 2030 a viabilidade de um reactor nuclear em Portugal.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

As renováveis são caras?

As centrais nucleares são essenciais na competitividade da UE
É o que conclui um relatório da Comunidade Europeia sobre energia. Segundo as conclusões de um draft do estudo, que "escapou" inadvertidamente diz o Financial Times, os europeus podem esperar que o preço da electricidade suba nos próximos 20 anos em resultado da aposta nas renováveis. Acredito que a APREN fique estarrecida com estas "novidades" mas para ninguém minimamente informada/o constitui qualquer surpresa as fontes renováveis encarecerem a electricdade. Fico curioso para ver se vai haver consequências práticas deste relatório no prosseguimento da aposta renovável e consequente enfraquecimento económico da UE, ainda para mais quando se assiste à migração do poder económico e político para uma Ásia pró-nuclear.

O estudo, que será divulgado em Dezembro, construiu cinco cenário de mix energético e concluiu (realces meus):
The assessment shows what would happen to prices, costs and energy sources under five different scenarios to make the EU less dependent on conventional fossil fuels such as coal and gas, which now account for more than half the electricity generated in the bloc.
Of the five scenarios examined, the highest electricity prices are forecast in a “high renewables” scenario which envisages more supply of North Sea off-shore wind plus “significant” concentrated solar power – plants that concentrate the sun’s rays to produce steam and drive a turbine – and micro power generation from solar and wind.
Average electricity prices for households and businesses would rise “strongly up to 2020-2030” under all scenarios, the document says, and the highest prices would occur after 2030 if renewable sources of power, such as wind and solar, make up a large share of energy production. For example, average prices for households could jump by more than 100 per cent by 2050 if this were the case but only by 43 per cent under a scenario that assumed more nuclear power and carbon capture and storage were used.
The cheapest prices are predicted in a so-called “diversified supply” scenario, which assumes support for renewable energy but also acceptance of nuclear power and the commercial viability of carbon capture and storage. 
Mais claro não podia ser. O Carbon Capture and Storage (CCS), se vier a funcionar tecnicamente e for ambientalmente permitido, vai comprometer a competitividade económica das termoeléctricas (o relatório até fala em viabilidade). Fica implícito que a Europa, como qualquer região desenvolvida, não pode prescindir de energia atómica.
The report suggests this would be partly due to new infrastructure investments but it also appears to assume that conventional fuel plants would not run as much as they do now, meaning higher prices would have to be charged to cover initial investment costs.
Em Portugal este fenómeno motiva a existência de CMECs. O relatório europeu tem o bom senso de admitir que é por causa das renováveis que a produção termoeléctrica trabalha menos horas e por isso tem de ser paga para estar disponível. A APREN e a imprensa nacional pró-renovável acham que não.

Nem França escapa a onda anti-nuclear

François Hollande
Noticia hoje o Expresso que uma sondagem realizada ontem em França dá uma larga vantagem a François Hollande sobre Nicolas Sarkozy na corrida presidencial. Esta sondagem vem na sequência da disputa interna do partido socialista francês do passado domingo. Nessas primárias Hollande venceu Martine Aubry para se tornar no candidato socialista às eleições de 2012. E que importância poderá ter a vida política interna de França para o Luz Ligada?

Enquanto Sarkozy sempre afirmou durante a crise de Fukushima o total compromisso com a energia nuclear quer Aubry quer Hollande têm menos entusiasmo por esta forma de produção energética. 

De acordo com o Wall Street Journal Aubry prometeu, caso fosse eleita, acabar com a energia nuclear em França. "We must prepare our country for a progressive exit from nuclear power," she said in a speech last month. "We must use the excellence of our nuclear industry to…dismantle nuclear plants." Se fazer afirmações destas num país com 30% de contributo nuclear como a Alemanha é irresponsável dize-lo em França, que depende em 75%, é idiota. Depois de, em 20 anos, França se ter praticamente livrado da necessidade de recorrer a combustíveis fósseis para produzir energia eléctrica ia agora voltar atrás? Como é que ia mitigar a perda da sua indústria nuclear nacional que é uma das líderes mundiais? E que diferentes argumentos ambientais é que Aubry iria usar para acabar com o nuclear e voltar atrás na proibição de hydraulic fracking no país para explorar reservas de gás xistoso? Ou Aubry viveria bem com a dependência de gás natural russo e magrebino para produzir electricidade francesa?

Hollande foi mais moderado nos seus objectivos mas mesmo assim afirmou pretender que, até 2025, o contributo nuclear para o mix francês desça dos 75% para os 50%. Mesmo que França deixasse de exportar energia eléctrica 25% do consumo francês equivale a mais do dobro do português o que dá ideia da enormidade da afirmação de Hollande.

Se é convicção dos dois socialistas ou se foi uma mera posição circunstancial eleitoralista não sei mas não deixa de ser preocupante que a recente onda hipócrita anti-nuclear que varreu a Europa tenha chegado à alta política do país que é o símbolo das virtudes da energia nuclear civil. Recorro ao artigo do WSJ mais duas vezes:
"It's dramatic for France," said Christian Pierret, a Socialist Party member and former energy minister. "To win a few votes, we risk damaging the image of an industrial sector that we dominate."
"One has no right to play up medieval fears to put into question the choices which have made our country great," Mr. Sarkozy said when he visited a nuclear plant in May.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

PNBEPH na TV

Já me referi ao Plano Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroeléctrico (PNBEPH) aqui, aqui ou aqui. Num dos recentes episódios do programa televisivo Biosfera, Pinto de Sá e Joanaz de Melo, que foram dos primeiros portugueses a manifestarem-se contra a irracionalidade do plano, voltam a enunciar as razões dessa posição. O Prof. Pinto de Sá esclarece ainda no seu blog a necessidade de haver garantia de potência nas barragens, tal como acontece para as termoeléctricas, em virtude da imprevisibilidade da produção eólica.

O ministro da economia não gosta de subsídios


Há vida para além da austeridade. Chama-se combate à subsidio-dependência, chama-se lutar contra os interesses instalados
A frase é do ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira, e proferida hoje durante uma conferência. Dado que é este ministro que tem a pasta da energia e que em Portugal praticamente toda a produção eléctrica é subsidiada fica aqui o registo da frase para a revisitarmos daqui a uns meses.

Se quiser saber o que fazer basta ouvir o presidente da ERSE, Vítor Santos, que afirma que os consumidores estão a suportar "um ónus excessivo" com a PRE.

Já durante a tarde o ministro reconheceu que "se nada fosse feito, o défice tarifário nacional seria em 2020 superior a oito mil milhões de euros"O que "foi feito" (ou a troika precipitou) ninguém fora do gabinete do ministro conhece mas a curiosidade, pelo menos neste blog, é grande. De acordo com o actual secretário de Estado da Energia, Henrique Gomes, o défice tarifário já ronda os três mil milhões de euros.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Pormenores do tarifário eléctrico 2012

Acabadinho de fazer 4 anos o Ecotretas está imparável. No último post sobre a Proposta de Tarifas e Preços para a Energia Eléctrica em 2012 da ERSE, que reflecte o ardiloso diferimento do défice tarifário 2010, dá-nos alguns detalhes muito interessantes sobre as consequência políticas que a medida está a ter.

As consequências económicas vamos sentir em 2013. Graças à medida "excepcional" o aumento em 2012 face a 2011 será de 4%.

Portugal não suporta um reactor nuclear? (2ª parte)

Depois de ter analisado os cenários de um mix de produção de energia eléctrica em Portugal em 2025 com três e duas centrais nucleares de 1.600 MW parece-me interessante conceber mais dois cenários, 1 reactor nuclear e 0 reactores e máximo de eólica. Antes de continuar parece-me útil esclarecer alguns pontos:
  1. Graças à generosidade da remuneração, a co-geração que era suposto servir apenas para aproveitar calor gerado noutras actividades, tornou-se uma oportunidade de negócio para empresas que nem têm a geração eléctrica como core business. Assim a co-geração está sobredimensionada em Portugal, como denunciaram recentemente Delgado Domingos e Mira Amaral, e podia ser reduzida, o que facilitaria a integração de produção nuclear nos vários cenários.
  2. Como não consigo saber qual o valor justo mantenho a produção dos últimos 12 meses.A eficiência da bombagem é, como até reconhece o PNBEPH, inferior aos 75% que tenho considerado. Admitindo 70% de eficiência o país, em 2025, terá capacidade de consumir 6.570 GWh/ano em bombagem, ou 2250 MW médios.
  3. Para facilitar as contas tenho deixado de fora outras formas de produção eléctrica (solar, biomassa, RSU, mini-hídrica, etc). Não só porque geram quantidades pequenas de energia e por isso facilmente consumidas, mas também porque algumas (solar, mini-hídricas, microprodução) deviam perder os subsídios elevados que recebem e por isso o mais provável seria estarem extintas em 2025.
  4. Na 1ª parte admiti que em 2025 não existe produção eléctrica com carvão e através de turbinas eólicas. Em 2025 o nosso parque produtor a carvão já estará velho a que se soma as penalizações ambientais, que espero, tornem economicamente obsoleta esta forma de produzir energia eléctrica. Se Portugal diminuir (ou acabar) com as tarifas feed-in para a eólica a adição de parques vai acabar. Como a longevidade de um parque é de cerca de 15/20 anos em 2025 já sobrará pouca potência eólica instalada.
  5. Não acredito que em 2025 o consumo nacional seja igual ao de 2010. Não só porque me parece que obter 25% de eficiência energética como o governo pretende para 2020 é optimista como espero que a economia do país se desenvolva e cresça entre 2015 e 2025. Adiciono mais 5.000 GWh para bombagem o que dá um total de 57.200 GWh. Refiz as contas dos cenários 1 e 2.
  6. O consumo mínimo de 4.500MW admitido exclui bombagem.
As condições enunciadas na 1ª parte mantêm-se.

Cenário 3 (1 reactor nuclear - 1.600 MW)
Somando os 1.600 MW aos 734 MW da co-geração a produção de base fica aquém do consumo. A bombagem não é necessária. 21% das necessidades de abastecimento do país (57.200 GWh/ano) são satisfeitas com nuclear. A co-geração vale 11%.  O potencial hidroeléctrico líquido (13.300 GWh/ano) cobre mais 23%. A maior fatia, 45% (25.553 GWh) poderá vir das centrais de ciclo combinado que funcionarão com uma produtividade bastante maior ou numa combinação gás natural/eólica/bombagem acreditando que a produção eólica é economicamente competitiva nessa altura e que a bombagem servirá para aproveitar importação barata da Europa.

Tendo em conta o tempo que leva a construir uma central nuclear e a situação política em Portugal, até este cenário em 2025 me parece mais um acto de fé do que uma forte probabilidade de ser concretizada, ainda que mais provável do que os cenários 1 ou 2.

Cenário 4 (sem produção nuclear, máxima prioridade à co-geração seguida da eólica; não recorrer à exportação por excesso de eólica)
A capacidade máxima de escoamento em vazio é de 6.750 MW (4.500 + 2.250). Descontando os 734 MW da co-geração isso permite o país esticar até um máximo teórico de 6.016 MW de potência eólica instalada sem obrigar à exportação. Este valor é inferior aos 6.800 MW constantes no PNAER português. Com uma produtividade de 25%, o parque eólico forneceria 23% (13.175 GWh) das necessidades do país, praticamente o valor que analisei aqui. A co-geração mais 11% e as barragens mais 31% (23% líquidos e 8% em resultado da bombagem). O gás natural teria de contribuir com os restantes 34%, o que faria da produção termoeléctrica a base do diagrama de cargas.

Conclusão
Tendo em conta os pressupostos que considerei para a construção destes quatro cenários o 4 (eólico) só permite importar menos gás natural (ou usar menos algarvio) do que com a instalação de uma central nuclear. Três centrais nucleares em 2025 iria sobredimensionar e encarecer o parque por obrigar a manutenção de CMECs. A existência de duas centrais nucleares seria o cenário mais racional, que garantia maior independência energética e o preço da electricidade mais baixo.

Se se mantiverem as actuais tarifas feed-in para as renováveis o cenário 4 é aquele que produzirá o preço mais elevado de electricidade, provavelmente o mais alto do mundo em 2025, dado que esse custo é ainda ampliado por se recorrer enormemente à bombagem com uma eficiência baixa. As consequências no preço de se associar eólica subsidiada e bombagem abordei aqui e Pinto de Sá detalhou melhor aqui.

Algarve vai produzir gás natural

O Ecotretas postou este fim de semana que o licenciamento de exploração de gás natural ao largo do Algarve vai finalmente, ao fim de quase dez anos, avançar. A reacção do lobby renovável não se fez esperar, nomeadamente através do Eng. Ângelo Correia que tem interesses no sector. Tudo porque a independência energética e a poupança de importação de combustíveis fósseis é uma dos grandes argumentos dos defensores da produção renovável, como ficou bem patente no recente estudo da APREN.

Estima-se que as reservas algarvias tenham capacidade para 10 anos de consumo nacional. É pena que este potencial algarvio não seja todo aproveitado pelo castramento actual do funcionamento das centrais de ciclo combinadoem virtude da primazia dada ao consumo de energia eléctrica renovável. Infelizmente terá de ser assim durante mais alguns anos. Pelo menos enquanto os parques eólicos portugueses, cuja possibilidade de se desligarem da rede não foi acautelada, não forem desmantelados.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Mais do mesmo

Défice tarifário 2009 (ERSE)
Verdade seja dita o ministro tentou que os produtores termoeléctricos dessem uma ajuda na manutenção do preço da energia eléctrica mas eles bateram o pé. Os produtores em regime especial, aparentemente, são intocáveis em Portugal e para eles a vida despreocupada continua. A solução foi a fuga para a frente ou, em linguagem técnica, "diferimento excepcional". Isto é, o défice tarifário de 2010 só vai ser pago em 2013 e não em 2012

É a solução do governo para evitar o aumento da electricidade atinja os 30% para os privados e os 55% para as empresas. De excepcional este diferimento não tem nada. Em 2009, o governo Sócrates arranjou o mesmo subterfúgio para tapar o buraco da política energética portuguesa em ano de eleições legislativas e diferiu o défice por Decreto-Lei n.º 165/2008.

Há umas semanas atrás mostrei a minha preocupação com a situação incomportável que se está gerar no sector eléctrico no nosso país. Assim, e para manter a metáfora montanhista do post, a bola de neve não vai parar de descer a encosta e engrossar com mais tarifas feed-in que vai apanhando pelo caminho aqui ou aqui.

Portugal não suporta um reactor nuclear? (1ª parte)

Construção de Olkiluoto 3 (Finlândia) - 1.600MW
A deambular pela net caiu-me esta apresentação powerpoint no colo. O documento de 31 slides é da autoria de Delgado Domingos, Prof. Cat. do IST, e serviu para uma exposição numa Conferência sobre Energia Nuclear promovida pelo Diário Económico em Abril de 2009. O Prof. Delgado Domingos tem denunciado as mentiras do aquecimento global antropogénico e ainda há pouco tempo criticou, com toda a razão, a calamidade a que se chegou em Portugal com uma co-geração principescamente remunerada. O Prof. Delgado Domingos é uma referência nacional em conhecimento sobre energia pelo que esta sua apresentação me parece, apesar de ter apenas frases-chave, merecedora de contra-argumentação. É uma demonstração cabal da resiliência da opção nuclear quando alguém com os recursos do Prof. Delgado Domingos tenta disputar esta verdadeira uphill battle contra a energia atómica. Nesta apresentação o Prof. Delgado Domingos pretende convencer que Portugal não tem consumo eléctrico que comporte um reactor nuclear de 1.600 MW.

1.600 MW corresponde aos mais potentes reactores nucleares que existem e Portugal podia optar por instalar um reactor mais comedido. Mas como na geração eléctrica a escala anda de mãos dadas com a eficiência defendo que o país devia fazer-se equipar com os maiores. Vou fazer as contas para três e dois reactores de 1.600 MW.

Condições para a construção de cenários 2025:
  1. Considero que apenas a co-geração deve ter a primazia de acesso à rede por ser uma medida de eficiência energética e por ter de estar condicionada ao funcionamento das indústrias que a produzem. Todas as outras fontes de energia eléctrica em regime especial podem limitar a sua produção às horas de maior procura ou não têm razões que se sobreponham à hierarquia do preço. Admitindo produção constante, nos últimos 12 meses a co-geração valeu 6433 GWh (4.636 GWh fóssil + 1.797 renovável GWh) o que dá uma potência média de 734 MW.
  2. Em 2020 o país vai ter uma capacidade de bombagem em barragens de 6.570 GWh (70% de eficiência). Se se admitir que a bombagem se vai efectuar nas oito horas de menos consumo a capacidade média de consumo nessas horas é de 2.250 MW.
  3. Consumo mínimo em vazio de 4.500 MW + 2250 MW da bombagem.
  4. Consumo anual estabilizado nos 52.200 GWh (valor 2010) + 5.000 GWh da bombagem.
  5. Centrais termoeléctricas a carvão e parques eólicos atingiram fim de vida.
Cenário 1 - (3 reactores nucleares - 4.800MW)
Aos 4.800 MW nucleares adicionam-se os 529 MW prioritários da co-geração pelo que existe um excendente de (4800+734-4500) = -1034 MW, cerca de 40% da capacidade de bombagem das barragens. É um cenário perfeitamente realizável que não obriga a exportação a preço de saldo.
Num cenário de 3 reactores, 62% das necessidades de abastecimento do país (57.200 GWh/ano) ficariam satisfeitas com nuclear. A co-geração valeria 11% e a bombagem fornecia 4% (2.113 GWh) o que significa que as barragens sem bombagem conseguiriam quase satisfazer os 23% que sobram. O restante parque produtor seria praticamente redundante. Na prática isso não seria viável economicamente

Cenário 2 - (2 reactores nucleares - 3.200 MW)
Com 3.200 MW de geração nuclear mais 734 MW vindos da co-geração fica-se com um défice de (3.200+734-4.500) =  -566 MW que tinha de ser coberto com produção térmica, hídrica ou importação. A bombagem só seria necessária para consumir energia eólica excedentária ou energia importada em vazio.

Neste cenário 42% do consumo seria abastecido com nuclear, mais 11% de co-geração. Dos restantes 47%, 23% podiam vir das barragens (13.300 GWh/ano) e os restantes 24% das centrais de ciclo combinado. As necessidades estavam satisfeitas sem outras fontes. É um cenário viável técnica e economicamente.

Torres de arrefecimento
Portugal tem consumo para ter no seu parque produtor dois ou três reactores nucleares de 1.600 MW. Tendo em conta o parque existente em 2025 só no cenário 2 seria, eventualmente, necessária produção renovável em regime especial para complementar.

Ao contrário de um cenário de energia eólica de base de que não existe nenhum exemplo no planeta, a França (75% de nuclear), Suécia (40%), República Checa (30% agora e 60% em 2030) ou Finlândia (30% agora e 40% em 2025) são exemplos de que é possível ter uma forte componente nuclear na produção eléctrica num país.

O Prof. Delgado Domingos continua a esgrimir argumentos anti-nuclear sem nenhuma consistência:
Em cada 18 meses, o reactor tem de parar cerca de 30 dias, para reabastecimento em combustível e manutenção. Substituir a falta de 1600 MW de modo planeado ou forçado não é economicamente viável seja devido às interligações à rede espanhola /europeia seja à sobrecapacidade que exigiria à produção nacional.
É talvez o maior obstáculo técnico à presença de reactores nucleares em Portugal. Na minha opinião o surgimento de energia nuclear em Portugal deve ser concertada com a renovação e alargamento do parque nuclear espanhol. Que vai acontecer, mais tarde ou mais cedo, quando os espanhóis descerem à Terra e a um défice tarifário de €25.000M.

Espanha tem dimensão para ter 16 reactores de 1.600 MW. Com os nossos 3 daria um total de 19 na Península Ibérica. Mesmo com a paragem de um todos os meses existiria fornecimento ininterrupto, salvo avarias, de 18 reactores.

As interligações necessárias para uma produção com fontes renováveis equivalente a 18 reactores de 1.600MW exigiria muito mais investimento na rede.
O nuclear, devido à rigidez na produção (devida a factores tecnológicos estruturais) tem de ocupar a base do diagrama de cargas retirando espaço às energias renováveis mais competitivas e à cogeração.
Mesmo com três reactores nucleares em funcionamento no país mostrei acima que existe espaço para a co-geração e para um parque eólico de dimensão razoável. A restante produção renovável, por ser controlável, pode ser reservada para os períodos de maior procura de consumo.
Com o desmantelamento da metalomecânica pesada, Portugal perdeu o know-how e a capacidade de participação significativa em qualquer programa de construção duma central nuclear
Não existe em Portugal know-how e capacidade de participação significativa na construção de nenhuma forma de produção de energia eléctrica. À semelhança do que acontece nas barragens as empresas portuguesas podem participar na construção civil de uma central nuclear. Na parte técnica algumas empresas podem dar o seu contributo como vai fazer a EFACEC nas novas centrais norte-americanas.


Um grupo nuclear de 1600 MWe liberta no ambiente mais de 3200 MW sob a forma de calor, cerca do dobro de uma central a gás de
ciclo combinado e muito mais do que uma central a carvão. Nenhum dos rios suportaria com segurança o arrefecimento directo. Uma torre de refrigeração evapora o equivalente ao consumo de água de
Lisboa
Os principais centros de consumo de electricidade em Portugal estão no litoral. As centrais podem ser construídas na costa e arrefecidas com água do mar.


Encontrar argumentos consistentes contra a energia nuclear afigura-se difícil. Apesar de ter os seus inconvenientes é a forma mais sustentável de obter energia eléctrica controlável, barata e abundante.

Na segunda parte desta reflexão equaciono os cenários de 1 e de 0 reactores.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Outro aeroporto comercial na Grande Lisboa?

Aeroporto de Beja
Depois do estrondoso sucesso que foi a abertura do aeroporto de Beja, que recebeu 798 passageiros nos 4 meses de Verão , o governo considera replicar a receita mas agora mais perto de Lisboa. A nova infraestrutura destinar-se-ia às companhias aéreas, inteligentemente auto-designadas, low cost.

Nunca entendi a diferenciação fundamental que se faz entre companhias low cost e tradicionais como se o negócio de todas elas não fosse transportar passageiros do aeroporto A para o aeroporto B.

Sei que a melhor forma de acabar com o, aparente, tratamento preferencial de que as companhias low cost gozam é começar a tratá-las exactamente como as restantes. A começar por se deixar cair o slogan low cost.

Abrir um aeroporto de propósito para as companhias low cost quando a Portela ainda não está esgotada ultrapassa a minha compreensão. Nenhuma companhia aérea vai fazer essa transição voluntariamente. A utilização do novo aerporto só será conseguido com enormes descontos que compensem a inferior competitividade da localização. É um filme que conhecemos, querer forçar uma lógica anti-mercado só é possível recorrendo a incentivos, como se faz para as energia renováveis e os carros eléctricos.

A abertura de outro aeroporto civil na região de Lisboa para aeronaves grandes, ou a solução Portela+1 como o governo gosta de lhe chamar, vai contra o memorando que os três principais partidos nacionais assinaram com a troika (realce meu):  
An in-depth analysis of the transport system including an assessment of existing capacity, forecast demand, and projected traffic flows;

Measures to facilitate entry for low-cost airline companies, making use of the existing infrastructure;
Vai contra o acordo da troika e vai contra o interesse nacional. E é despropositado numa altura em que fortes sacrifícios se pedem aos portugueses.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Carros eléctricos não seduzem europeus

Renault Fluence ZE
O Espectador Interessado posta hoje sobre o desinteresse europeu pelos carros eléctricos como o Renault Fluence ZE (Zero Emisions - claro que as emissões dos carros eléctricos são tão boas como as das fontes eléctricas que os alimentam).

Esta falta de procura por carros eléctricos acontece também nos países que dão incentivos para a sua compra por terem fortes necessidades de consumir excessiva energia eólica, caso de Portugal. Por cá ainda só cerca de 120 carros eléctricos encontraram comprador.

Como reconheceu à Bloomberg Thomas Orsini do departamento de veículos eléctricos da Renault “If the subsidies disappear too soon, the market won’t get off the ground.”

terça-feira, 11 de outubro de 2011

O marketing inconsistente da APREN (5ª parte - sugestões de política tarifária)

Confesso que, enquanto contribuinte, tenho tido dificuldade em compreender onde se encontra a valia de €278.368 do estudo realizado pela Roland Berger para a APREN. Nas minhas críticas um, dois e quatro ressalvo como o estudo é pautado por argumentos desviantes e omissões imperdoáveis que em nada contribuem para ajudar a perceber a competitividade de cada fonte primária de energia eléctrica. Esta última parte do sumário, por outro lado, é original e traz novas e relevantes sugestões. Finalmente entendo a razoabilidade de tantos milhares de euros de dinheiros públicos gastos!

Resumidamente, de acordo com a Roland Berger, a resolução do problema do preço crescente da electricidade portuguesa consegue-se com uma simples cosmética da factura. Vamos analisar em mais detalhe:

Em primeiro lugar, devem ser adoptados ajustes à metodologia de cálculo do diferencial da PRE-FER face à PRO que conduzam a uma análise ajustada dos custos de geração e internalizem os custos e benefícios relacionados com os dois tipos de geração. Verifica-se que a estrutura tarifária actual apresenta uma visão distorcida do custo de energia, ao não reflectir nessa parcela a totalidade dos custos PRO, nomeadamente os custos com os CAE e CMEC, pois são custos de geração da PRO contratualizados.
Estes aspectos já foram rebatidos nas análises anteriores. A novidade vem a seguir:

Desta forma, estas parcelas sairiam da rubrica dos Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) passando a integrar os custos de energia, limitando o aumento que se tem verificado nestes “custos de política energética” e que não têm correspondência com a evolução da PRE-FER.
Ou seja, os CAE e os CMEC, esses malvados que penalizam o preço da electricidade deviam ser expostos publicamente. Não desaparecem mas pelo menos são tratados pelo verdadeiro nome. As tarifas feed-in, essas coitadas, continuam a ser necessidades de interesse geral e por isso devem ser protegidas debaixo de uma parcela colectiva. As tarifas feed-in não são apenas de interesse particular para os associados da APREN e afins, são formas de viabilizar produção eléctrica cheia de externalidades positivas e por isso interessa a todos. E de qualquer forma são custos que estão "15% abaixo da média dos países Europeus e a actual FIT aplicada à energia eólica, para os projectos instalados a partir de 2009 (70 €/MWh), apresenta-se igualmente como a mais baixa". O que são os €11,3M que vai custar anualmente o novo parque solar da Martifer Solar face ao que se vai poupar em importação de combustíveis fósseis ou licenças de CO2? Estes argumentos dariam para rir se não tivessem custado tão caro para serem escritos.
Com o ajustamento do custo da energia, o peso dos CIEGs na tarifa passa de 41% para 15% na estrutura estimada para 2011.
No final a factura é a mesma mas depois desta operação de charme custará certamente menos a pagar.
O valor do diferencial da PRE deverá estar separado entre a componente renovável, PRE-FER, e não renovável, PRE-NFER (cogeração fóssil). Além disso este diferencial deveria ser autonomizado dos CIEG, já que tem peso que o justifique, evitando associações incorrectas.
Naturalmente, separe-se ainda mais o trigo do joio da PRE. A co-geração fóssil só interessa às grandes empresas que a exploram, jamais à generalidade dos consumidores. Para além disso, é suja e poluidora.
Sugere-se também a substituição da expressão “sobrecusto” por “diferencial de custos”, já que estes podem ser positivos ou negativos.
Bravo, outra sugestão estruturante que irá sem dúvida aliviar a factura dos consumidores.

Verifica-se ainda que da dívida tarifária de 2010, apenas 15% está afecta à PRE-FER e que este valor não tem origem num desvio não previsto desta forma de geração, mas numa decisão extraordinária de não repercutir o diferencial da PRE em 2009, ao contrário da prática comum. Esse custo deve então ser imputado ao custo de energia do Comercializador de Último Recurso (CUR) e não à PRE.
Fantástico! A PRE não tem culpa das más decisões políticas. O défice acumulado por excessiva remuneração de PRE é um mito que importa desfazer.

Conclusão

Na lógica da Roland Berger e da APREN se se retirar da parcela CIEG tudo o que não é custo com renováveis esta vai emagrecer de tal forma que os consumidores vão perceber como é baratinha a electricidade gerada com vento e sol. Pouco importa a proporção entre custo e electricidade produzida. Pouco importam os investimentos necessários para reforço da rede, bombagem ou backup térmico, eles deixam de estar na parcela CIEG e por isso não são imputáveis às renováveis.

Na visão da Roland Berger e da APREN não existe nenhum problema fundamental com o custo da produção eléctrica em Portugal. Existe sim uma injusta atribuição às renováveis do preço da electricidade que convém separar.

Como a própria APREN faz questão de lembrar neste sumário não é a primeira vez que emite estudos (realce da própria APREN):

Noutro estudo promovido pela APREN, realizado em 2008, previa-se que, em 2015, o sector das energias renováveis contribuiria em 4.120 M€ para o PIB Nacional, e seria responsável pela geração de 60.800 empregos.
Como dá para notar, já nessa, altura a APREN mostrava uma visão realista sem mácula.

Meu comentário

A APREN não quer que nada mude, de facto, na política tarifária. Mas isso nós já sabíamos. Escusava o ministério da economia ter gasto €278.638. O problema do custo da electricidade é grave e transversal a toda a economia nacional. Exigia-se à APREN mais seriedade nas afirmações que faz.