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Construção de Olkiluoto 3 (Finlândia) - 1.600MW |
A deambular pela net
caiu-me esta apresentação powerpoint no colo. O documento de 31 slides é da autoria de Delgado Domingos, Prof. Cat. do IST, e serviu para uma exposição numa Conferência sobre Energia Nuclear promovida pelo Diário Económico em Abril de 2009. O Prof. Delgado Domingos tem denunciado as mentiras do aquecimento global antropogénico e ainda há pouco tempo criticou, com toda a razão, a
calamidade a que se chegou em Portugal com uma co-geração principescamente remunerada. O Prof. Delgado Domingos é uma referência nacional em conhecimento sobre energia pelo que esta sua apresentação me parece, apesar de ter apenas frases-chave, merecedora de contra-argumentação. É uma demonstração cabal da resiliência da opção nuclear quando alguém com os recursos do Prof. Delgado Domingos tenta disputar esta verdadeira
uphill battle contra a energia atómica. Nesta apresentação o Prof. Delgado Domingos pretende convencer que Portugal não tem consumo eléctrico que comporte um reactor nuclear de 1.600 MW.
1.600 MW corresponde aos mais potentes reactores nucleares que existem e Portugal podia optar por instalar um reactor mais comedido. Mas como na geração eléctrica a escala anda de mãos dadas com a eficiência defendo que o país devia fazer-se equipar com os maiores. Vou fazer as contas para três e dois reactores de 1.600 MW.
Condições para a construção de cenários 2025:
- Considero que apenas a co-geração deve ter a primazia de acesso à rede por ser uma medida de eficiência energética e por ter de estar condicionada ao funcionamento das indústrias que a produzem. Todas as outras fontes de energia eléctrica em regime especial podem limitar a sua produção às horas de maior procura ou não têm razões que se sobreponham à hierarquia do preço. Admitindo produção constante, nos últimos 12 meses a co-geração valeu 6433 GWh (4.636 GWh fóssil + 1.797 renovável GWh) o que dá uma potência média de 734 MW.
- Em 2020 o país vai ter uma capacidade de bombagem em barragens de 6.570 GWh (70% de eficiência). Se se admitir que a bombagem se vai efectuar nas oito horas de menos consumo a capacidade média de consumo nessas horas é de 2.250 MW.
- Consumo mínimo em vazio de 4.500 MW + 2250 MW da bombagem.
- Consumo anual estabilizado nos 52.200 GWh (valor 2010) + 5.000 GWh da bombagem.
- Centrais termoeléctricas a carvão e parques eólicos atingiram fim de vida.
Cenário 1 - (3 reactores nucleares - 4.800MW)
Aos 4.800 MW nucleares adicionam-se os 529 MW prioritários da co-geração pelo que existe um excendente de (4800+734-4500) = -1034 MW, cerca de 40% da capacidade de bombagem das barragens. É um cenário perfeitamente realizável que não obriga a exportação a preço de saldo.
Num cenário de 3 reactores, 62% das necessidades de abastecimento do país (57.200 GWh/ano) ficariam satisfeitas com nuclear. A co-geração valeria 11% e a bombagem fornecia 4% (2.113 GWh) o que significa que as barragens sem bombagem conseguiriam quase satisfazer os 23% que sobram. O restante parque produtor seria praticamente redundante. Na prática isso não seria viável economicamente.
Cenário 2 - (2 reactores nucleares - 3.200 MW)
Com 3.200 MW de geração nuclear mais 734 MW vindos da co-geração fica-se com um défice de (3.200+734-4.500) = -566 MW que tinha de ser coberto com produção térmica, hídrica ou importação. A bombagem só seria necessária para consumir energia eólica excedentária ou energia importada em vazio.
Neste cenário 42% do consumo seria abastecido com nuclear, mais 11% de co-geração. Dos restantes 47%, 23% podiam vir das barragens (13.300 GWh/ano) e os restantes 24% das centrais de ciclo combinado. As necessidades estavam satisfeitas sem outras fontes. É um cenário viável técnica e economicamente.
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Torres de arrefecimento |
Portugal tem consumo para ter no seu parque produtor dois ou três reactores nucleares de 1.600 MW. Tendo em conta o parque existente em 2025 só no cenário 2 seria, eventualmente, necessária produção renovável em regime especial para complementar.
Ao contrário de um cenário de energia eólica de base de que não existe nenhum exemplo no planeta, a França (75% de nuclear), Suécia (40%), República Checa (30% agora e 60% em 2030) ou Finlândia (30% agora e 40% em 2025) são exemplos de que é possível ter uma forte componente nuclear na produção eléctrica num país.
O Prof. Delgado Domingos continua a esgrimir argumentos anti-nuclear sem nenhuma consistência:
Em cada 18 meses, o reactor tem de parar cerca de 30 dias, para reabastecimento em combustível e manutenção. Substituir a falta de 1600 MW de modo planeado ou forçado não é economicamente viável seja devido às interligações à rede espanhola /europeia seja à sobrecapacidade que exigiria à produção nacional.
É talvez o maior obstáculo técnico à presença de reactores nucleares em Portugal. Na minha opinião o surgimento de energia nuclear em Portugal deve ser concertada com a renovação e alargamento do parque nuclear espanhol. Que vai acontecer, mais tarde ou mais cedo, quando os espanhóis descerem à Terra e
a um défice tarifário de €25.000M.
Espanha tem dimensão para ter 16 reactores de 1.600 MW. Com os nossos 3 daria um total de 19 na Península Ibérica. Mesmo com a paragem de um todos os meses existiria fornecimento ininterrupto, salvo avarias, de 18 reactores.
As interligações necessárias para uma produção com fontes renováveis equivalente a 18 reactores de 1.600MW exigiria muito mais investimento na rede.
O nuclear, devido à rigidez na produção (devida a factores tecnológicos estruturais) tem de ocupar a base do diagrama de cargas retirando espaço às energias renováveis mais competitivas e à cogeração.
Mesmo com três reactores nucleares em funcionamento no país mostrei acima que existe espaço para a co-geração e para um parque eólico de dimensão razoável. A restante produção renovável, por ser controlável, pode ser reservada para os períodos de maior procura de consumo.
Com o desmantelamento da metalomecânica pesada, Portugal perdeu o know-how e a capacidade de participação significativa em qualquer programa de construção duma central nuclear
Não existe em Portugal know-how e capacidade de participação significativa na construção de nenhuma forma de produção de energia eléctrica. À semelhança do que acontece nas barragens as empresas portuguesas podem participar na construção civil de uma central nuclear. Na parte técnica algumas empresas podem dar o seu contributo como vai fazer a EFACEC nas novas centrais norte-americanas.
Um grupo nuclear de 1600 MWe liberta no ambiente mais de 3200 MW sob a forma de calor, cerca do dobro de uma central a gás de
ciclo combinado e muito mais do que uma central a carvão. Nenhum dos rios suportaria com segurança o arrefecimento directo. Uma torre de refrigeração evapora o equivalente ao consumo de água de
Lisboa
Os principais centros de consumo de electricidade em Portugal estão no litoral. As centrais podem ser construídas na costa e arrefecidas com água do mar.
Encontrar argumentos consistentes contra a energia nuclear afigura-se difícil. Apesar de ter os seus inconvenientes é a forma mais sustentável de obter energia eléctrica controlável, barata e abundante.
Na segunda parte desta reflexão equaciono os cenários de 1 e de 0 reactores.