domingo, 7 de agosto de 2011

Euromilhões polaco


Iniciei este blog a comentar os avanços na perfuração que desencadearam um novo paradigma no sector energético por permitir a extracção do gás natural preso em camadas de xisto no subsolo. À medida que se melhoram as técnicas de perfuração e se viabiliza a exploração de reservas não convencionais de gás natural o mundo assiste a uma redistribuição das quantidades relativas a que cada país tem acesso. Se em 2002 cerca de 75% do gás natural vinha da Rússia e do Médio Oriente (ver quadro) as reservas de gás xistoso (shale gas em inglês) existem em países como a Índia, África do Sul, Argentina e França (ver mapa-mundo). Este facto tem bastante importância por duas razões:

1. Gestão da produção 

Reservas mundias de gás xistoso
Com o crescimento da procura mundial por electricidade e o esgotamento das capacidades hidroeléctricas globais a utilização de gás natural torna-se vital para dar resposta às variações de consumo durante o dia. As centrais termoeléctricas a gás natural têm uma vantagem enorme sobre as centrais a carvão ou nucleares. Essa vantagem é o menor tempo de arranque ou paragem e até mesmo a capacidade de operarem sem ser na potência nominal. Essa característica torna-as particularmente flexíveis para cobrir variações de carga na rede, nomeadamente as provocadas pela intermitência das energias eólica e solar.

2. Segurança energética

Esta é provavelmente a maior razão pela qual a capacidade de extracção de gás natural contido em camadas xistosas é tão significativo. Até há pouco tempo o gás natural estava quase todo na posse de países politicamente menos estáveis e muitos deles com quezílias históricas com os países ocidentais. Por exemplo, 40% do gás natural consumido em Portugal vem da Argélia. Este cenário vai mudar o paradigma. Nos EUA, que estão a liderar a tecnologia e extracção de shale gas, cerca de metade da electricidade aí consumida é produzida queimando carvão. Sendo os EUA o maior consumidor de electricidade do mundo a substituição de todas as centrais a carvão por gás natural teria um impacto decisivo na qualidade do ar não só do continente americano mas de todo o mundo. E isso agora é possível com gás natural obtido dentro de fronteiras. Estima-se que as reservas americanas de gás natural com o contributo do shale assegurem, ao ritmo de consumo actual, o fornecimento durante 100 anos. A Energy Information Association (EIA) americana prevê que em 2035 cerca de metade do gás consumido nos EUA seja shale.

Esquema do processo hydraulic fracking
Também a Europa comunitária foi presenteada com reservas de gás xistoso. A Polónia, cuja produção eléctrica depende quase na sua totalidade de carvão, detém as maiores reservas europeias e já se diz que se pode tornar na Noruega (que é rica em petróleo) do gás natural. As segundas maiores reservas europeias pertencem à França, no entanto, não vão ser exploradas enquanto não se esclarecer melhor as dúvidas relativamente à segurança do fracking necessário para libertar o gás da sua prisão de xisto. Os receios dos franceses não são infundados, o hydraulic fracking envolve a injecção de água a alta pressão com areia e agentes químicos para abrir fracturas na rocha e assim soltar o gás natural. Este método já originou contaminação de águas subterrâneas nos EUA e tem levantado questões sobre a sua segurança. Nenhuma forma de obtenção de energia é isenta de riscos, principalmente uma que ainda dá os primeiros passos. Estes casos verificados apontam para a necessidade de existência de legislação mais profunda e inspecções mais rigorosas para que o hydraulic fracking e o shale gas não tragam mais desvantagens do que benefícios. A reserva francesa em relação à exploração do gás xistoso terá que ver com a segurança do processo mas, provavelmente, também com a ameaça que a abundância de gás natural constitui para a expansão da energia nuclear.

2 comentários:

  1. De facto e ao contrário de outros bloguistas que se dedicam a denunciar casos menos claros da temática das energias, o sr. traz algum sentido a esta discussão. Não critica porque lhe apetece criticar e acima de tudo, não omite desvantagens, nem desdenha daqueles que tentam proteger a natureza. Por estes motivos lhe dou os parabéns.
    Só podemos ter qualidade de vida se respeitarmos o meio natural em que vivemos e é possivel aliarmos as duas coisas sem andarmos a falar de ecotopias e outras coisas parvas do género.
    Continuação de bom trabalho.

    Luis Rodrigues

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  2. Caro Luís Rodrigues,

    Obrigado pelas suas palavras. Apesar dos idealismos ecotópicos quererem contornar a realidade só existem três formas de produzir electricidade de base: nuclear, gás natural e carvão. O carvão é, de longe, o mais nocivo para o ambiente e se a humanidade o conseguir reformar seria um grande avanço para o planeta.

    Bruno Carmona

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