quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Um habitante de Fukushima que não passa sem cigarros

O jornal Expresso conta a história engraçada de um japonês que vive na zona de exclusão da central nuclear de Fukushima. Evacuado como todos os seus conterrâneos, Naoto Matsumura de 52 anos, regressou, à revelia das autoridades, para a sua vila onde é o único habitante. Passa os dias a cuidar das plantações e animais, ou do que resta deles. Muitos morreram de fome por não ter havido tempo para abrir os estábulos durante a evacuação das pessoas.

O engraçado da história é que Naoto Matsumura tem uma dieta alimentar pouco variada e fuma muito. Diz que para se aliviar do stress de viver privado das normais condições de vida e da perda do seu património. Os hábitos de vida menos saudável deste agricultor, semelhantes aos de muitas pessoas no mundo moderno, terão um impacte na sua vida maior do que as consequências da libertação da radiactividade da central nuclear. A diferença é que Matsumara tem a coerência de temer tanto com as consequências de umas como das outras.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Eólica algarvia amiga das aves

O Expresso notícia que o parque eólico do Barão de S. João em Sagres tem um sistema de protecção das aves migratórias único no mundo. A notícia poderá surpreender muita gente em Portugal não pelo sistema mas por tomarem conhecimento que os aerogeradores matam aves. Cá não existem estudos sobre este assunto ou os que existem não são divulgados mas é um facto unânime e que já foi abordado pelo Ecotretas.
É de louvar este esforço de poupança de vida animal mas a solução encontrada é caricata. Com o auxílio de um radar e binóculos vigilantes apercebem-se da aproximação de pássaros e comandam a paragem dos aerogeradores que se processa em menos de 4 minutos. Em todo o caso, os aerogeradores estão parados ou a rodar a baixa velocidade a maior parte do tempo mas o método é possível principalmente porque o parque tem uma potência de apenas 50MW irrelevante para estabilidade da rede eléctrica. Imagine-se se este parque fosse uma peça importante do fornecimento de energia eléctrica de base. Quando víssemos um bando de aves a passar ficávamos a saber que daí a uns minutos deixaríamos de ter electricidade em casa ou no trabalho.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Futuro do nuclear a ser construído

Apesar do acontecimento em Fukushima ter criado um compasso de espera 2012 deverá recolocar os vários projectos de construção de novas centrais nucleares no mundo de novo em cima da mesa. Ainda para mais por terem começado a existir sinais de que a economia mundial está prestes a sair da crise que se abateu sobre ela em 2008. Contrariamente ao que se veicula penso que será mais a exploração de novas formas de gás natural e não Fukushima a poder boicotar este renascimento do nuclear que, para já, parece estar a afirmar-se.

HTGR Antares da Areva
O renascimento do nuclear terá que ser acompanhado necessariamente por inovação no desenho de reactores. A regulamentação será cada vez mais apertada o que levará a uma obsolescência mais rápida das actuais tecnologias. Também a inovação na utilização das outras fontes evoluirá pelo que o nuclear terá de se aperfeiçoar para não morrer. A inovação e competitividade no nuclear é tanto mais importante pela pouca popularidade que tem entre as comunidades. Ainda que acredito que ela tenderá a melhorar não me parece que alguma vez o nuclear vá gozar de wishful thinking fantasioso como aquele que alimenta hoje em dia as fontes renováveis intermitentes. A energia nuclear terá de se continuar a impor pelos números.

Creio que a inovação acontecerá naturalmente desde que haja mercado e aí é preciso facilitação política. Quando digo facilitação não me refiro a apoios mas apenas a planeamento e legislação que permita a construção de novas centrais nucleares. Sou optimista ao ponto de achar que se esse espaço para o nuclear for criado a visão de Bill Gates de uma concorrência feroz e altamente inovadora de soluções nucleares surgirá.

Na semana passada houve duas notícias que ajudam a alimentar a convicção de que o nuclear está longe de estar morto. Da Índia chegou a notícia de que o governo local planeia, no começo de 2013, preparar o funcionamento (commission - uma etapa fundamental para a entrada ao serviço de um reactor) do seu primeiro reactor nuclear de 4ª geração. Trata-se do primeiro de um conjunto de cinco reactores de neutrões rápidos ou Fast breeder reactors (FBR)com uma potência de 500MWe, muito superior ao experimental de 13MW existente no país ou ao de 20MW que a China ligou à rede no verão passado.

Os FBR têm a capacidade de consumir urânio 238 (o mais abundante) e por isso têm um consumo específico de urânio muito mais baixo do que a actual geração. Os FBR conseguem inclusivamente consumir resíduos produzidos nos reactores actuais. Este novo reactor constitui o começo da segunda fase do prgrama nuclear indiano, um dos mais ambiciosos do mundo. A primeira fase começou na década de 70 com a construção de reactores que usam água pesada para arrefecimento (Pressurized Heavy Water Reactor - PHWR) e que se ofram tornando cada vez mais potentes à medida que o país ia acumulando know-how. A Índia tem neste momento alguns PHWR em construção. Os FBR destinam-se precisamente a consumir os resíduos que os PHWR geraram ao longo das últimas décadas. A terceira fase terá lugar com o lançamento daquilo a que os indinao designam de advanced reactor que será capaz de consumir tório 232, um material quatro vezes mais disponível na Terra do que o urânio 238 e do qual a Índia detém as maiores reservas mundiais.

Nos EUA, país que recentemente aprovou a construção da sua primeira central nuclear em 30 anos,viu agora a Next Generation Nuclear Plant Industry Alliance (NGNP) seleccionar um design de reactor de 4ª geração arrefecido a gás. A NGNP é uma joint venture criada pelo governo central em 2005 que visou juntar esforços entre várias empresas ligadas ao sector energético para desenvolver e contruir até 2021 um reactor High-temperature Gas-cooled Reactor (HTGR) arrefecido a gás em alternativa à água comum nos reactores actuais. A escolha caiu no reactor Antares da francesa Areva. A utilização de um refrigerante alternativo permite aumentar a temperatura de funcionamento do reactor até perto dos 1000ºC. Para além da maior eficiência do reactor na produção de energia eléctrica as temperaturas elevadas que o gás pode atingir permitem-lhe gerar calor ou produzir hidrogénio em cogeração. Isso torna este tipo de reactor bastante apetecível para outras indústrias e não apenas as que exploram a produção eléctrica. A aliança NGNP é constituída por algumas petrolíferas e outras empresas que actuam no sector químico.

A industrialização de reactores de 4ª geração será um passo decisivo para o futuro da energia nuclear no mundo. A eficiciência destes reactores afasta definitivamente questões de duração de reservas de urânio. E por diminuirem grandemente a quantidade e perigosidade dos resíduos que criam colocam-se noutro patamar de segurança face aos reactores actuais.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Entrevista a ex-presidente da ERSE

Fica aqui uma entrevista longa mas interessante com o ex-presidente da ERSE Jorge Vasconcelos da qual eu destacaria os comentários sob a ausência de concorrência na produção eléctrica de Portugal e Espanha que impedirá que o mercado grossista ibérico se liberalize efectivamente nos próximos dez anos, a menos que alguns direitos adquiridos sejam revogados.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Europa dá vida ao nuclear

Manifestações de apoio e repúdio em Garona
Na semana passada tivemos dois sinais de que a energia nuclear poderá conhecer nova fase expansionista na Europa agora que muitos países revêem as suas metas de integração de fontes renováveis intermitentes.

Depois de ter dividido a opinião pública espanhola o encerramento da central nuclear de Garona decretado pelo anterior governo socialista para ter lugar em 2013 foi agora revisto pelo PP. O executivo de Rajoy decidiu prolongar por mais cinco anos (com a possibilidade de um sexto) o tempo da vida desta central que foi ligada à rede em 1971. Apesar da crise espanhola que, à semelhança do que está acontecer em Portugal, deverá levar o consumo eléctrico a diminuir no país vizinho o governo considera que não é oportuno nem estratégico prescindir da geração eléctrica em centrais nucleares.

Também na semana passada David Cameron e Nicolas Sarkozy, por ocasião da cimeira franco-inglesa, asinaram acordos bilaterais de cooperação no desenvolvimento de novas centrais nucleares no Reiuno Unido. As Ilhas britânicas querem tornar-se um dos países com maior peso de nuclear no seu mix electroprodutor e empresas com grande experiência no sector, caso da EDF e Areva, estão a participar activamente na renovação do parque electroprodutor britânico.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Debate televisivo prós e contras: ausência do nuclear

Esta semana irei comentar mais detalhadamente alguns aspectos debatidos no programa Prós e Contras da passada segunda-feira mas hoje vou referir-me ao aspecto da ausência do nuclear no debate que já vi abordado em mais do que um local, nomeadamente pelo Ecotretas que é contra a energia nuclear em Portugal por razões que discordo mas que compreendo.

Acho que os defensores do manifesto fizeram bem em não mencionar o tema nuclear. Em primeiro lugar por que nem todos apoiam a solução e em segundo lugar porque não existe ainda em Portugal maturidade e objectividade para debater este assunto pacificamente. Como o Ecotretas bem ressalvou o programa teve alturas de quase descontrolo e a discussão do nuclear poderia ter consequências ainda mais desastrosas. Basta referir que no final do programa quando Patrick Monteiro de Barros preferiu a palavra nuclear Carlos Pimenta quase entrou em colapso nervoso. E Carlos Pimenta tem formação de engenharia, é supostamente entendido no sector energético e portanto deveria ter uma visão mais pragmática sobre o tema. Não há condições para se debater nuclear numa praça tão pública e, ao contrário de uma sugestão no programa, sou totalmente contra um referendo em Portugal sobre este assunto. Na verdade, sou contra referendos de cariz técnico que exijam conhecimentos que a maioria dos portugueses não tem e por isso nunca poderia votar conscientemente. A energia nuclear deve ser discutida por quem sabe e em espaços próprios.

Sobre a introdução da energia nuclear em Portugal a questão não é se mas quando. Se há coisa sobre a qual tenho a certeza absoluta é que a energia nuclear fará um dia parte do mix produtivo de Portugal. Talvez não no meu tempo de vida mas fará. A central nuclear é como o automóvel, o telemóvel ou a caixa ATM ou a ainternet. O seu benefício é de tal forma gritante e óbvio que lutar contra ela exige argumentos falaciosos e apaixonados como aqueles que Carlos Pimenta esgrimiu no debate.

A aversão nacional à energia nuclear faz-me lembrar a luta dos comerciantes tradicionais contra os centros comerciais e os hipermercados. Uma luta que tinha aquela emblemática e aberrante distorção de as grandes superfícies estarem proibidas de abrir ao domingo. Supostamente era para defender o dia da família mas sempre me lembro de dizer que essa medida tinha os dias contados. Quem beneficiava com isso? Apenas os comerciantes tradicionais.

Permitir que a energia eléctrica de base do país venha de centrais nucleares é abrir as grandes superfícies ao domingo. Eu sei que vai acontecer um dia mas faço força para que seja quanto antes para bem de todos os portugueses.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

A crise europeia, o aquecimento global e o ocaso do sector renovável

Os dois últimos artigos de opinião do site Energy Tribune merecem uma breve reflexão. Neste primeiro Peter Glover resume os anunciados cortes nos apoio às energias renováveis que estão a acontecer um pouco por toda a Europa motivados pela crise europeia encabeçada pela crise da dívida grega. Este cortes são circunstanciais, isto é, resultam de uma pressão económica e não da assunção pelos governos europeus da insustentabilidade do modelo eletroprodutor renovável. A questão natural que se coloca é, passada esta tormenta, os subsídios serão reestabelecidos?

Até há uma semana a minha opinião é de que não, jamais os países europeus subsidiarão tanto as energias renováveis como até aqui. Num post recente até considerei que no mundo desenvolvido (pelo menos de acordo com a designação do séc. XX) 2010 marcou o pico da instalação de potencia renovável. Mas, e volto a frisar, até há uma semana, estava convencido que mal a Europa começasse a recuperar os governos restituariam alguns dos subsídios. É essa a posição espanhola ou portuguesa que divulguei aqui. Em boa retórica política foi dito que os cortes são por tempo indeterminado e a interpretação que fiz foi: só quando houver dinheiro!

Mas na semana passada houve um acontecimento que poderá ter ditado a não restituição dos subsídios agora eliminados. O lançamento do livro "Die Kalte Sonne" pelo conhecido ambientalista alemão Fritz Vahrenholt que vem pôr em causa o aquecimento global antropogénico. Este acontecimento, já abordado pelo Ecotretas, tem o potencial de abalar a crença de uma das sociedades mais acérrimas na sua defesa. Os objectivos alemães e europeus na integração de fontes renováveis resultam em grande medida de se acreditar que o planeta está a aquecer.

Junte-se à falência da teoria do aquecimento global a revolução do shale gas e parece-me cada vez menos provável que as fontes renováveis de energia eléctrica voltem a ter a popularidade que gozaram até aqui. Desde a semana passada que acho que as decisões espenhol e portuguesa de parar futuros projectos renováveis serão permanentes.

Só espero é que não se passe de um extremo ao outro, isto é, temo que o carvão volte a ser aceite. Para dar três exemplos, temo que a Alemanha coloque o carvão (de que possui reservas) à frente do nuclear e do gás natural como fonte de energia primária. Temo que a Polónia abrande a sua aposta nuclear ou que a Dinamarca deixe de perspectivar uma inevitável reforma das suas centrais a carvão.

É que entre estes dois cenários, excesso de renováveis ou excesso de carvão não sei qual o pior. Mas creio que à semelhança do resto do mundo será o gás natural a fonte a mais crescer na produção eléctrica europeia. Quanto ao nuclear, como tenho escrito, a exploração de shale gas e o fim da teoria do aquecimento global não lhe augura um futuro risonho no médio prazo.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

O pragmatismo turco

Já tenho abordado a estratégia energética turca simplesmente porque é um dos concorrentes naturais do nosso país. Sabendo que a competitividade do custo da energia eléctrica é um factor de competitividade das empresas, também das exportadoras, é útil saber aquilo que andam a fazer os nossos competidores. Há umas semanas referi o projecto turco de construção de duas novas centrais nucleares em parceria com japoneses.

Agora o governo de Ankara juntou-se a sul coreanos para desenvolver duas novas centrais a carvão. O objectivo é reduzir a dependência do gás russo e iraniano. Antes de ser pró-nuclear sou anti-carvão mas consigo entender o ponto de vista, a ideia de independência energética é utópica mas a segurança energética deve ser uma preocupação primordial de um país, principalmente um situado numa região tão sensível.  Com as novas centrais nucleares e a carvão a Turquia pretende acompanhar a procura crescente por electricidade na economia turca e ao mesmo tempo reduzir de 50 para 30% o peso do gás no seu mix electroprodutor.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

A obsessão com a criação de emprego nas renováveis

Os defensores portugueses das renováveis têm dois argumento obsessivos, a potência instalada e a criação de emprego. É compreensível, não têm outros números em que fiquem bem na fotografia. Sobre a irrelevância da potência instalada face à energia produzida já me referi várias vezes, este post debruça-se sobre a a propalada criação de emprego. A APREN, com toda a sua demagogia, previa, em 2008, que em 2015 as energias renováveis criariam 60.800 empregos. Um número perfeitamente ilusório que testemunha a eufórica complacência pró-renovável que se vivia em Portugal antes da recessão mundial começar a trazer alguma objectividade a alguns observadores do sector. Hoje, até a APREN terá de rever os seus números depois do anúncio em relação ao congelamento de novos projectos renováveis. Não vou fazer uma contabilidade dos empregos efectivamente gerados pelas fontes renováveis em Portugal até porque a discussão não precisa de chegar tão longe para se desmontar este argumento falacioso dos defensores das renováveis. E não precisa por três razões fundamentais:
  1. Contar empregos criados e não os dividir pela energia eléctrica produzida não nos diz nada sobre a importância desses empregos. O sector eléctrico não foge à necessidade de eficiência e a eficiência só se mede reduzindo cada emprego à energia eléctrica que ele coloca na rede.
  2. Embora aparentemente desconhecido em Portugal, nos outros países europeus que apostaram fortemente em energias renováveis olha-se para o sector de uma forma mais científica e estudos aí realizados revelam que as energias renováveis destroem mais empregos na economia real do que aqueles que criam. Em Portugal, onde ao contrário dos países citados nunca existiu uma indústria de equipamentos para parques eólicos e solares, o rácio entre empregos criados e destruídos, principalmente nos mais qualificados, é ainda pior. Isso não interessa aos empresários que têm beneficiado das subvenções às renováveis mas é central numa análise do contributo positivo que o sector trouxe à economia portuguesa e à geração de emprego.
  3. Mas acima de tudo a criação de emprego não é um vantagem quando se fala de sector electroprodutor. Um centro electroprodutor é tanto melhor quanto menos empregos gerar. 
Confesso sentir algum constrangimento em escrever sobre conceitos tão básicos de racionalidade empresarial mas quando se usa tantas vezes o argumento da criação de emprego parece que nem toda a gente tem esta noção. A energia eléctrica não é um produto acabado que apela à emoção como um carro ou roupa ou um serviço diferenciado como um hotel de luxo ou um spa. É nesse tipo de produtos ou serviços que se consegue fazer diferença, seja na qualidade intrínseca ou tangível dos mesmo seja em valores mais abstractos e emocionais.

A energia eléctrica é um serviço básico, é um meio e não um fim em si mesmo. Pela particularidade de a energia eléctrica não ser um bem transaccionável e provir da mesma rede de distribuição nem sequer é possível distinguir a sua origem. Os consumidores não têm hipótese de fazer opções de origem da energia que consomem. Eu não sei se a energia eléctrica que me permite estar neste momento a escrever este texto no computador veio de Sines, Espanha ou de um parque eólico qualquer. Se um restaurante tiver um empregado por cada mesa ao invés de 10 mesas o serviço é com certeza melhor. Mas se amanhã a central do Carregado contratar mais 50 trabalhadores isso não mudará nada na forma como a máquina de lavar roupa cá em casa trabalha. Pode soar mal mas o sector electroprodutor ideal é aquele que não emprega ninguém. Ou aquele que emprega tão pouca gente quanto seja possível sem comprometer a sua eficiência.

Outra coisa completamente diferente seria os defensores portugueses das renováveis vangloriarem-se da criação de empregos qualificados indirectos na pesquisa e desenvolvimento, não na produção de energia. Porém isso é coisa que não existe. Isso seria estruturante e revelaria saúde e pujança do sector. Mas como se sabe em Portugal nunca houve visão para tal e neste momento é tarde. É tarde porque 2010 deverá ter marcado o pico da aposta renovável no mundo ocidental. E é tarde porque os chineses estão a tomar conta da indústria de fabrico de turbinas eólica e painéis solares.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Defender nuclear em Portugal é uma uphill battle

Defender a energia nuclear em Portugal é aquilo a que os ingleses designam de uphill battle. A maioria dos portugueses tem um medo inexplicável e não justificado em relação à energia nuclear. Vou admitir que seja a maioria pois começo a achar que existe uma grande minoria silenciosa que não é anti-nuclear. Atribuo esse medo ao desconhecimento. Mas a questão é que mesmo pessoas aparentemente informadas sobre o sector energético são incapazes de serem objectivos quando se fala de energia nuclear. Se os especialistas não são capazes de ser objectivos como se pode esperar que a maioria da população seja?
Um bom exemplo foi dado no programa Olhos nos Olhos 18 da passada terça-feira 31 de Janeiro. Ainda que não seja um especialista em energia nuclear Agostinho Pereira de Miranda é um advogado que há muitos anos trabalha com empresas no sector petrolífero. Prova do seu conhecimento do sector é dado no video acima quando, revelando dados interessantes sobre as reservas e o custo de exploração de tar sands no Canadá, desmonta a ideia do peak oil.

Mesmo não sendo um especialista em energia nuclear Agostinho Miranda não se furtou a comentar sobre ela. Ironicamente é precisamente com um argumento de peak uranium que Agostinho Miranda afasta a viabilidade desta forma de energia para solucionar o fornecimento de energia eléctrica numa escala mundial. E se Agostinho Miranda vê como desactualizada a teoria do peak oil qualquer pessoa minimamente entendida em energia nuclear sabe que Agostinho Miranda está redondamente enganado em relação ao nuclear. Os equívocos começam no minuto 7:00 deste segundo filme:
Primeiro argumento: Impacte ambiental. Começa por mencionar o custo ambiental do ciclo de vida de uma central nuclear. O custo ambiental de uma central nuclear tem de ser vista em relação à energia que ela produz. Como esta produz quantidades enormes de energia eléctrica a partir de pequenas quantidades de urânio a pegada ambiental por MWh produzido é das mais baixas (só comparável à hídrica) de todas as fontes de energia eléctrica conhecida.
Segundo argumento: o custo elevado. França tem a energia eléctrica mais barata da Europa. A Alemanha com a paragem das centrais nucleares viu o preço da electricidade aumentar. Os países com mais renovável tem as energias mais caras da Europa. Ouço muitos detractores do nuclear usar a segurança como razão mas o preço da electricidade? Éuma ideia ainda mais gasta do que o peak oil.

Terceiro argumento: o tempo de construção. Per si não é um impedimento, requer planeamento estratégico de longo prazo. Em Portugal onde isso não existe pode considerar-se uma desvantagem. O grande inconveniente do prazo de construção alargado de uma central nuclear está nos custos decorrentes de derrapagens na construção. Ainda assim esse inconveniente não detém vários países de apostar fortemente na construção de centrais nucleares.

Quarto argumento: falta de reservas de urânio. Agostinho Miranda afirma que para que a energia nuclear fornecesse toda a energia do planeta seriam precisos 8.000 reactores nucleares ao invés dos actuais 450 (6%) e que para isso não existe combustível necessário. Os números estão correctos mas a argumentação é descabida. Primeiro, provavelmente apenas de carvão existem reservas para se pensar numa planeta com uma única fonte de energia. Depois Agostinho Miranda sabe que é tecnicamente inviável nas próximas décadas substituir o petróleo por electricidade no sector dos transportes. Fazer cenários de 100% de energia de origem nuclear é inútil e só revela parcialidade intelectual.
Mais, se o mundo decidisse apostar de forma tão decidida em centrais nucleares a investigação e desenvolvimento teria um enorme incremento de financiamento. Muito mais rapidamente a 4ª geração de centrais e a utilização de tório como combustível seria industrializado. Com estas inovações que se perspectivam a existência de reservas de combustível nuclear torna-se um problema inexistente. O peak uranium de Agostinho Miranda coloca-se tanto como o peak oil que o próprio afasta.

Logo de seguida cita Churchil para afirmar que o futuro está na diversificação de fontes. Afasta a energia nuclear por esta não ser capaz de fornecer toda a energia que o mundo precisa mas as renováveis fazem sentido num cenário de diversificação de fontes. Objectivamente Agostinho Miranda não consegue eliminar a solução nuclear e fá-lo esgrimindo entraves absurdos, entraves que não coloca a outras fontes de energia.

Defender o nuclear em Portugal é não só esclarecer quem tem preconceitos infundados sobre o assunto mas também contrariar argumentos inconsistentes de pessoas supostamente informadas. É um duplo desafio, uma uphill battle!

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Serão assim tão poucos os apoiantes portugueses do nuclear?

A coisa que mais me tem impressionado desde que iniciei este blog e que inevitavelmente me leva a conversar mais sobre este assunto com amigos e não só é a quantidade de portugueses que apoia a introdução de energia nuclear em Portugal. Naturalmente não conheço pessoas suficientes para poder ter uma amostra do país nem, seguramente, o leque de pessoas com quem falo é representativa da população portuguesa mas ainda assim surpreende-me a quantidade de pessoas que nada têm contra a introdução de energia nuclear em Portugal se daí resultarem benefícios. A questão está longe de ser considerada prioritária mas em todo o caso não se opõem.

Creio que não dão muita relevância à questão porque, mesmo aqueles que não são anti-nuclear, têm a ideia de que as energias renováveis são baratas e sustentáveis. É inegável que a propaganda de Manuel Pinho, José Sócrates, António Sá da Costa entre outros foi eficaz e está largamente difundida na população portuguesa, mesmo entre engenheiros, economistas e pessoas com maior capacidade analítica.

Pode parecer contraditório mas sou da opinião que quanto mais pobre o país ficar mais oportuna e possível será a construção de uma (ou duas) centrais nucleares em Portugal. Quanto mais pobre o país estiver maior enfoque será colocado no preço da energia eléctrica, logo maior ambiente existirá para a aposta nuclear. O lançamento do terceiro manifesto do movimento Energia para Portugal acontece, por isso, no momento exacto.

E para os mais cépticos deixo este link da World Nuclear News que divulga uma sondagem na Grá-Bretanha que mostra que os britânicos consideram que a renovação do parque de centrais nucleares é o investimento em infraestruturas mais relevante que o governo de Cameron pode fazer.

Portugal congela novos projectos PRE

Como era de alguma forma esperado e seguindo as pisadas do governo espanhol o executivo português decidiu congelar novos projectos de produção eléctrica em regime especial que é o mesmo que dizer fontes renováveis (fica de fora a hídrica) e cogeração. Pressionado pela troika e num ambiente de contracção da enconomia nacional não havia muita escapatória. Já em Outubro tinha escrito aqui que o Plano Energético para 2020 tinha objectivos inconciliáveis e que mais tarde ou mais cedo algum teria de cair. Felizmente o bom senso prevaleceu e o sector pode começar a ser analisado com mais racionalidade daqui em diante.

Espero que agora os objectivos do país nesta matéria passem, como defendo neste blog, pelo fim da aposta no carvão e que se substitua carvão e excesso de renováveis por nuclear e gás natural. Se Portugal fizer isso estará na vanguarda mundial da criação de um mix energético competitivo e sustentável. Ou então podemos esperar que os nossos vizinhos, alemães ingleses e o resto da Europa nos mostrem o caminho. Não tenhamos dúvidas, tal como a IAE (International Energy Agency) tem vindo a prever nos seus relatórios o carvão, o gás natural e o nuclear continuarão a ser os pilares da produção eléctrica nas décadas vindouras. Apagar o carvão do mix seria um excepcional exemplo de modernidade e protecção ambiental que a Europa podia dar ao mundo, principalmente ao mundo emergente.

Agora coloca-se a questão, para que servirá a fábrica de turbinas eólica que a China Three Gorges prometeu como contrapartida na privatização da EDP. E pode-se perguntar também que interesse estratégico pode haver na entrega do controlo da principal eléctrica portuguesa a uma empresa que aposta maioritariamente (pelo menos por enquanto) em fontes renováveis quando o país acaba de virar as costas a essas fontes. Mas sobre a venda da EDP aos chineses escreverei noutro post.