A forma como a produção eléctrica em Portugal está organizada parece irreal. Confesso que ainda hoje preciso de fazer um esforço para reconhecer que de facto é assim mesmo que ela está planeada. Como muitas pessoas não entendem na íntegra como funciona vou fazer uma analogia com o sector dos transportes que me parece ser elucidativo. Imaginemos que a electricidade é o transporte urbano e que o sector electroprodutor é representado pelos meios de transporte.
Os táxis (que são eléctricos) representam as fontes renováveis intermitentes (eólica e solar). Os autocarros equivalem à produção ordinária (termoeléctricas e barragens).
Os utentes são obrigados por lei a utilizar o táxi sempre que um esteja disponível mesmo que estejam numa paragem. Apesar do custo ao quilómetro do táxi ser superior ao do autocarro o preço de transporte não é diferenciado. Existe um bilhete válido para os dois tipos e o seu preço varia apenas com a distância percorrida e não o meio de transporte. O preço deste bilhete não cobre os custos de transportar pessoas de táxi por isso o Estado paga aos operadores de táxi um valor fixo por esse serviço (subvenções às renováveis - FIT).
Para além dos táxis, o Estado também atribui incentivos a proprietários privados de pequenas motos eléctricas para que estes transportem passageiros (micro-geração). Não existe obrigação de o fazer é escolha dos proprietários. Estes incentivos são de tal forma elevados que pagam a sua aquisição. Existem pessoas que acham possível um dia o transporte nas cidades ser feito exclusivamente nesta pequenas motos.
Também existe apoio estatal para as carrinhas de distribuição de mercadorias transportarem passageiros no espaço que tiverem livre (co-geração). É uma forma de aproveitar espaço que d eoutra forma se desperdiçava. No entanto, ainda que o negócio destas carrinhas seja a distribuição, a remuneração é tão elevada que algumas carrinhas circulam sempre vazias apenas interessadas em angariar passageiros.
À semelhança dos táxis também as pessoas são obrigadas a usar as motos e as carrinhas antes de irem de autocarro. O bilhete válido é o mesmo.
Os custos de se obrigar as pessoas a usar táxis, motos ou carrinhas quando podiam ir de autocarro são passados para os consumidores ao serem incluídos numa parcela do preço chamada Custo de Interesse Económico Geral (CIEG). Existe ainda outra parcela para manutenção de paragens, praças de táxi equivalente aos custos de rede eléctrica.
Os táxis têm uma capacidade limitada de passageiros transportados (baixa densidade de produção) e os taxistas têm horário livre (intermitência). O fluxo de utentes é conhecido mas o de táxis não. Isso faz como que o parque de táxis tenha de ser sobredimensionado ao mesmo tempo que a sua disponibilidade é aleatória. Para não provocarem engarrafamentos quando existem demasiados a circular existem parques de estacionamento que os acolhem (bombagem em barragens). Para mitigar falta de táxis a utilização da frota de autocarros não é optimizada para a procura. Está constantemente a circular independentemente de haver utentes nas paragens. Os operadores de autocarros recebem compensações sempre que circulam sem lotação esgotada, são os CMEC. Quanto mais táxis circulam e menos utentes necessitam de autocarros o valor de CMEC, FIT e aluguer de estacionamento aumenta.
Apesar do maior custo de se usar táxis eléctricos em vez de de autocarros o Estado considera vantajoso pois isso permite poupar na importação de combustíveis fósseis necessários ao funcionamento dos autocarros. No entanto, como quase toda a frota de táxis que opera em Portugal foi importada na realidade o serviço fornecido pelos táxis (equivalente à electricidade produzida pelas fontes renováveis) tem uma componente de importação tão ou mais elevada quanto os autocarros (fontes convencionais).
A energia nuclear equivaleria ao metro. Não usa combustíveis fósseis, não polui e é capaz de transportar quantidades enormes de pessoas (elevada densidade produtiva). O metro é a forma mais eficiente de transportar passageiros em cidades e por isso deve ser a base de um sistema de transportes urbanos sustentáveis, tal como a energia nuclear deve fornecer a energia de base.
A capacidade de resposta do metro, quer na supressão quer na adição de oferta é inferior ao autocarro (pouca flexibilidade) e por isso deve ser o autocarro a cobrir picos de procura. Tal como as centrais de ciclo combinado e barragens na eletroprodução.
Um acidente numa linha de metro tem proporções mediáticas elevadas. Apesar de haver mais acidentes a envolver autocarros ou táxis. E de estatisticamente a probabilidade de se ficar ferido num acidente rodoviário ser superior ao de sofrer um acidente no metro. O paralelismo com a energia nuclear é exemplar.
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