terça-feira, 21 de junho de 2011

O ping-pong de Merkel

Esta estória caricata começa a 6 de Outubro de 2010, há menos de 9 meses, quando a Chanceler alemã Angela Merkel anunciou o prolongamento da vida das suas 17 centrais nucleares, contrariando uma decisão anterior de acabar com a energia nuclear na Alemanha até 2022. A notícia irritou algumas franjas da sociedade alemã nomeadamente grupos ambientalistas. Avançemos no tempo até 27 de março de 2011, 16 dias após o sismo/tsunami japonês. Tão pouco tempo passado sobre o acidente na central nuclear de Fukushima a que se somou a contestação que já vinha desde Outubro ditou uma pesada derrota eleitoral dos democratas cristãos alemães em favor do partido dos verdes.

Os conservadores alemães tinham de reagir e a decisão surgiu cerca de dois meses depois quando Merkel voltou atrás e decidiu manter o fecho das centrais nucleares em 2022. Não vamos ter ilusões, a decisão não foi técnica ou reflectida, foi uma pura manobra política para recuperar votos. 2022 é uma eternidade num calendário político. Se a resolução de Outubro de 2010 durou dez meses quanto tempo durará esta? Pela minha parte não acredito que muito tempo, prescindir da energia nuclear é algo de sério e que a Alemanha nunca poderá levar a cabo sem provocar feridas profundas na sua indústria e no seu ambiente. O bom senso vai prevalecer como já o Japão está a dar mostras de estar a ter. Mais, Merkel disse que abandonará a produção nuclear sem importar energia atómica de França ou a incrementar a emissão de gases de efeito de estufa.

Uma coisa é falar outra bem diferente é fazer e vozes mais ponderadas e avisadas não tardaram a evidenciar que esses objectivos serão inconciliáveis. À cabeça, as metas colocadas pela União Europeia para 2020 conhecidas como "20-20-20" - 20% de quota de renováveis na produção-20% de emissão de gases de efeito de estufa tendo como referência 1990-20% de aumento de eficiência energética não serão alcançados. É estimado que se todas as centrais nucleares alemãs fecharem o país vai aumentar a emissão de CO2 no valor de 100 milhões de toneladas e ficar acima das suas metas ambientais para 2020 em cerca de 380 milhões de toneladas. É utópico substituir as 17 centrais nucleares por aerogeradores e paineis solares e mais centrais a carvão e gás terão de ser edificadas. No que toca a apostar em renováveis a Alemanha pode esquecer o solar pois o país não é reconhecido pelos seus dias de sol intenso. O grosso da produção renovável vai ter mesmo de recair sobre a eólica.

Grande parte da indústria e das centrais nucleares está situada a sul junto das cidades de Munique e Estugarda mas infelizmente, e ao contrário de uma central nuclear, uma turbina eólica produz mais ou menos consoante o local onde está situada. Acontece que o vento sopra mais forte no mar e em latitudes mais a norte por isso o Mar do Norte é a melhor localização para instalar novos parque eólicos. Até porque Alemanha não é virgem na utilização de turbinas eólicas e como é uma fonte de energia de baixa densidade (pouca produção por área de terreno) os melhores locais onshore já estão ocupados. Se o plano for levado adiante é preciso construir novas redes de alta tensão, uma medida capaz de gerar quase tantos ódios quanto as centrais nucleares.

A Alemanha não vai precisar de investir enormemente na sua rede eléctrica apenas para transportar energia do Mar do Norte para as indústrias do sul. Devido a, longe de ser virgem, ser uma das campeãs mundiais de integração de energia eólica e solar no seu mix energético (cerca de 17% de quota)  o investimento em mais eólicas levará esta quota a aproximar-se ou superar os 25%. Muitos especialistas consideram ser o limite até ao qual uma rede eléctrica consegue absorver a intermitência das renováveis. Uma dúvida que os alemães poderão vir a desvendada com frequentes blackouts.

Ainda que a rede suporte a intermitência da eólica/solar coloca-se evidentemente o problema da armazenagem da energia que é produzida nas horas erradas, sem controlo. Não só um grande desafio técnico como também um avultado investimento em equipamentos.

Como se constata, ainda não passaram dois meses e já se começa a perceber que acabar com a energia nuclear na Alemanha para além das nefastas consequências ambientais é um enorme desafio técnico e a requerer enormes desvios de recursos financeiros.

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